O heroismo do Estadão não foi bem assim
A mesma mídia covarde que hoje apregoa compromisso com a liberdade de imprensa – em ataques torpes ao governo Lula e especialmente a outros governos do continente, como o da Venezuela – acovardava-se durante a ditadura. Em 1973, recebeu uma lição de coragem cívica, dada por Gasparian, Opinião e o advogado Adauto Lúcio Cardoso. O Estadão ainda exerceu resistência à censura. Mas não é justo esquecer que quando Fernando Gasparian, diretor de Opinião, impetrou mandado de segurança contra a censura em 1973, o mesmo Estadão, através de seu diretor Ruy Mesquita, ficou atemorizado, negando-se a ser parte da causa. O artigo é de Argemiro Ferreira.
Argemiro Ferreira
Nunca é demais lembrar a resistência de O Estado de S.Paulo (e Jornal da Tarde) à censura – com os versos de Camões, as receitas de bolo e as fotos de flores. É justo lembrá-la em livro, como fez no 40° aniversário do AI-5, em dezembro do ano passado, o jornalista José Maria Mayrink, que escreveu "Mordaça no Estadão", sobre aqueles tempos difíceis que viveu.Mas não é justo esquecer que quando Fernando Gasparian, diretor de Opinião, decidiu impetrar mandado de segurança contra a censura em 1973, o mesmo Estadão, através de seu diretor Ruy Mesquita, ficou atemorizado, negando-se a ser parte da causa. Eu entenderia se a razão tivesse sido apenas o fato de ser Opinião um semanário alternativo, menor, enquanto o Estadão era um dos jornalões tradicionais do país, muito conhecido até no exterior. Mas Gasparian disse então a Ruy Mesquita que, se o Estadão preferisse não entrar junto com Opinião, estaria bem: entraria sozinho e o semanário, nanico, se somaria apenas depois à iniciativa.Essa história, com mais detalhes, foi contada pelo próprio Gasparian e está no livro "Opinião x Censura – Momentos da luta de um jornal pela independência", de J. A. Pinheiro Machado (editora L&PM, 1978). O motivo real dos Mesquita (o irmão Júlio estava então fora do país), além do medo de represálias, era o fato de já ter a promessa do general Ernesto Geisel de que a censura do Estadão seria levantada.Adauto Cardoso, um herói esquecidoO episódio teve ainda outro herói: Adauto Lúcio Cardoso, jurista da UDN, conspirador no golpe de 1964 e ex-presidente da Câmara (em 1966, até renunciar em protesto pela cassação dos mandatos de seis deputados da oposição), ideologicamente mais afinado com o Estadão do que com Opinião. Nomeado para o Supremo, votara a favor de habeas corpus para Vladimir Palmeira e Darcy Ribeiro. Mas em 1971 aposentou-se, envergonhado com uma decisão que mantivera restrições à liberdade de imprensa.Cardoso tinha prometido só voltar ao STF para defender a causa da liberdade de imprensa. Assim, ao ser procurado em 1973, concordou em ser o advogado de Opinião no caso. Como Estadão e Veja estavam também sob censura, explicou a Gasparian: a causa ganharia força se um deles (ou os dois) se somasse a ela. O dono de Opinião não tinha ilusões sobre os Civita, mas procurou Ruy Mesquita.Ficou desapontado com a resposta negativa. Naqueles dias o Estadão, que participara do complô do golpe, apostava na troca de generais, a se consumar no Planalto. O então presidente, Garrastazu Médici, tinha Orlando Geisel à frente do ministério do Exército – uma garantia de que só um grave acidente de percurso seria capaz de impedir em 1974 a ascensão do irmão dele, o também general Ernesto Geisel.Poupar o Estadão e esquecer o resto?Um amigo comum do jornal e do futuro presidente, segundo Gasparian, já tinha assegurado aos Mesquita que o novo governo ia tirar a censura do Estadão. De fato, isso ocorreria em 1975. Mas as vítimas menores – Opinião, O São Paulo, Tribuna da Imprensa, Movimento, etc – continuariam sob a mesma censura implacável. Ao confiar em Geisel, a família Mesquita ficou indiferente à sorte dos demais.Toda a prática da censura, explicitamente proibida na Constituição então em vigor, foi exposta – até com as minúcias ridículas e grotescas – na petição do mandato de segurança levada ao Tribunal Federal de Recursos, a 10 de maio de 1973, pelo advogado Adauto Lúcio Cardoso. Ao final, por 6 votos contra 5, o TFR decidiu: a censura prévia feita no Opinião pela Polícia Federal violava a Constituição.Consumada a decisão judicial, no entanto, a Polícia Federal avisou a redação de Opinião pelo telefone: “Não publiquem o jornal sem obedecer à censura. Se isso acontecer, temos ordem para apreender a edição”. Na manhã seguinte o general-presidente Garrastazu Médici, em simples despacho, mandou a PF ignorar a Justiça e manter a censura no jornal, com base no AI-5. Eis a íntegra do despacho, de 20 de junho:Despacho do Presidente – Processo 5005/73"Diante do exposto neste processo pelo Senhor Ministro da Justiça:1. Ratifico o despacho exarado em 30 de março de 1971, na exposição de motivos n° 165 B, de 20 de março daquele ano, no qual adotei em defesa da revolução, com fundamento no artigo 9 do Ato Institucional n° 5, as medidas previstas no art. 152, parágrafo 2°, letra E, da Emenda Constitucional b. 1;2. Tendo a decisão proferida no mandato de segurança impetrado pela Editora Inúbia Ltda. Afirmado não existir nos autos provas de imposição de censura por ato do Presidente da República, reitero a autorização de que a Polícia Federal estabeleça censura quanto ao período OPINIÃO.(a) Emilio Garrastazu Médici – Presidente da República"Um detalhe escabroso de tudo isso é que o tal despacho citado no ítem 1 (de 30 de março de 1971) teria sido secreto, nunca fora revelado. Assim, o mandado de segurança de Opinião tivera no mínimo o mérito de forçar a ditadura ou a revelar a existência de “despachos secretos” (como sabemos, havia também “decretos secretos”), ou a fabricar um às pressas (e a posteriori), na obsessão de forjar cobertura jurídica para invalidar a decisão do TFR.A mesma mídia covarde que hoje apregoa compromisso com a liberdade de imprensa – em ataques torpes ao governo Lula e especialmente a outros governos do continente, como o da Venezuela – acovardava-se então. Em 1973, recebeu uma lição de coragem cívica, dada por Gasparian, Opinião e o advogado Adauto Lúcio Cardoso. O Estadão, pelo menos, ainda noticiou o fato discretamente em sua primeira página do dia seguinte. O resto da mídia, nem isso.
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segunda-feira, 3 de agosto de 2009
sábado, 1 de agosto de 2009
A democracia está capengando. Esquerda terá que ser radical
A democracia está capengando. Esquerda terá que ser radical
A chamada “democracia eleitoral” dá sinais de esgotamento por todos os cantos do mundo. A democracia está atrofiada e precisa encontrar novas formas para rejuvenescer e que passam por uma participação mais efetiva da sociedade através dos movimentos sociais, mas também pela radicalização das propostas. A esquerda necessita libertar-se do drama de fazer as reformas que a direita sempre quis fazer, para impor uma agenda que amplie e radicalize a democracia. O artigo é de Éric Aeschimann, publicado no Libération e traduzido pelo Cepat (Centro de Pesquisa e Apoio dos Trabalhadores).
Éric Aeschimann - Libération (IHU On-line)
Tradução do artigo de Aeschimann (16/02/2008), publicada na revista IHU Online.Doença na democracia, nevoeiro nas urnas. É esse o efeito retardado de uma sucessão de escrutínios de resultados embaraçosos para a esquerda? Um movimento de humor diante da democracia liberal triunfal? Nova mania de alguns filósofos? Ou uma crise mais profunda? O fato está aí: a democracia, em todo o caso na sua forma eleitoral, está mal de saúde e os intelectuais vêm à sua cabeceira. Certamente para se perguntar pelo significado deste ataque de febre. Outros, mais radicais, para afirmar que, num mundo mais complexo e mais desigual que nunca, o sistema representativo não permite mais que a grande maioria participe da tomada de decisão coletiva e que se faz necessário se perguntar pelos próprios fundamentos.Punir os eleitos. Primeiramente, a constatação. Ela atravessa clivagens políticas. Vindos da esquerda antitotalitária, os historiadores das idéias soam o alarme. “A democracia eleitoral incontestavelmente erodiu”, escreveu Pierre Rosanvallon no final de 2006 em La Contre-Démocratie [A contra-democracia]. Próximo da segunda esquerda, ele descreveu as diversas formas da “desconfiança” democrática, da “democracia negativa”: abstenção, manifestações, vontade de vigiar e punir os eleitos. Na introdução do primeiro volume de L’Avènement de la démocratie [O advento da democracia], que apareceu no outono, seu colega Marcel Gauchet prefere falar de “uma anemia galopante”, de uma “perda de efetividade” que ele atribui a uma “crise de crescimento” de grande amplitude. A ironia quer que essas análises se desenvolvam num momento em que, praticamente em oposição ao campo de batalha intelectual, a crítica da “democracia formal”, tão velha quanto o marxismo, conhece uma segunda juventude.Testemunhando o inesperado sucesso do pequeno ensaio do filósofo Alain Badiou, De quoi Sarkozy est-il le nom ?, verdadeiro ataque da lei das urnas. “Todo o mundo percebe que a democracia eleitoral não é um espaço de escolha real”, escreve. Diante da “corrupção” das democracias pelas potências do dinheiro, teria chegado o momento de definir “uma nova prática daquilo que foi chamado de ‘ditadura’ (do proletariado). Ou ainda, e é a mesma coisa: um novo uso da palavra ‘Virtude’”.Muitas vozes se levantaram – as de Bernard-Henri Lévy ou do crítico literário Pierre Assouline – para denunciar o retorno de uma retórica associada ao comunismo estalinista. Michel Taubman, diretor da revista Le Meilleur des Mondes, suspeito de complacência para com o pensamento da esquerda, mostra uma certa tranqüilidade: “Há trinta anos, na França, 20% da população denunciava a democracia burguesa e acreditava na ditadura do proletariado. Vivemos com isso. Na realidade, esses intelectuais radicais não representam ninguém, porque, hoje, mesmo Besancenot defende a democracia eleitoral”. Portanto, que na França a discussão tome um aspecto tão enérgico não é casual. “Os franceses são, no contexto europeu, os mais pessimistas em relação à democracia e seus representantes”, nota Stéphane Rozès, diretor do Instituto CSA. A crise, diagnostica, é “espiritual” e ratifica o discurso da impotência dos políticos diante da mundialização.“Impotência”. Abstenção nas eleições presidenciais de 2002, vitória do ‘não’ à Constituição européia, “flechadas” tão bruscas quanto as efemérides pela Ségolène Royal depois François Bayrou, participação massiva na consagração de Nicolas Sarkozy, escrutínios locais transformados em ‘défouloirs’, a bússola fica desnorteada. Nem as extravagâncias sarkozianas nem a ratificação do mini-tratado europeu deverão contribuir para restaurar a confiança nas virtudes do voto. Algo para confortar Badiou, não enfastiado de constatar em seu livro: “A impotência era efetiva, mas agora ela é comprovada”.“Os franceses não reprovam nos políticos a sua falta de proximidade, mas sua irresponsabilidade”, retoma Rozès, acrescentando que os franceses são tão mais sensíveis nisso quanto seu viver em conjunto não está fundado sobre a religião ou a etnia, mas sobre a partilha dos ideais políticos. Resta colocar-se de acordo sobre as causas da impotência democrática. Este é o desafio da reflexão engajada. Para Marcel Gauchet, o acontecimento de uma concepção hipertrofiada dos direitos humanos acabou por privar a coletividade de todos os meios de ação. Patrick Braouzec, deputado comunista de Saint-Denis, pensa, ao contrário, que “ao lado das eleições, pelas quais as pessoas se interessam muito, mas que constituem um momento específico, a democracia só pode atrofiar se ela não se apoiar também sobre uma democracia participativa e sobre o movimento social”. Um “movimento social” de contornos fluidos – manifestações de rua, apoio às crianças indocumentadas, operações midiáticas das Crianças de Don Quixote... – e que, levado ao extremo, lembra o título de um livro do filósofo John Holloway, em voga entre os altermundistas: Mudar o mundo sem tomar o poder [São Paulo: Viramundo, 2003]. Fazer política, acordos, mas fora das urnas.O filósofo Slavoj Zizek, estrela do campus americano e habituado às brincadeiras provocadoras, vai ainda mais longe ao estimar que só “a violência popular” permitirá às classes desfavorecidas se fazerem ouvir nas democracias liberais. Zizek publica este mês na França uma coletânea dos “mais belos discursos de Robespierre”, precedido de uma longa introdução em que se pergunta como “reinventar um terror emancipatório”. Ícone da pop-filosofia, conhecida primeiramente por suas análises do cinema hollywoodiano, o homem é, portanto, o contrário de um nostálgico. Nos tempos do “socialismo real” lutou na Iugoslávia titista e participou dos primeiros passos da democracia eslovena. Sua radicalização parece mostrar que o desencantamento democrático não pode ser reduzido a uma exceção francesa.“Arrogância ocidental”. É que, um pouco por todo o mundo, os processos de democratização conhecem malogros de diversas ordens que pioram a “promoção da democracia”, para retomar o vocabulário em uso na ONU desde os anos 90: o Iraque e o Afeganistão, mas também a Rússia onde Putin recupera o poder, a Argélia ou a Palestina onde os islâmicos viram confiscar suas vitórias obtidas pelas urnas. Ou ainda, o crescimento dos populismos na Polônia, na Dinamarca, na Bélgica. Até mesmo uma América que, para impor a democracia, não hesitou em transgredir os princípios elementares do direito. No número de janeiro da Revista Esprit, Pierre Rosanvallon apontava “uma certa arrogância ocidental e uma certa cegueira em relação à natureza e aos problemas da democracia”.Tradução: Cepat
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16098
A chamada “democracia eleitoral” dá sinais de esgotamento por todos os cantos do mundo. A democracia está atrofiada e precisa encontrar novas formas para rejuvenescer e que passam por uma participação mais efetiva da sociedade através dos movimentos sociais, mas também pela radicalização das propostas. A esquerda necessita libertar-se do drama de fazer as reformas que a direita sempre quis fazer, para impor uma agenda que amplie e radicalize a democracia. O artigo é de Éric Aeschimann, publicado no Libération e traduzido pelo Cepat (Centro de Pesquisa e Apoio dos Trabalhadores).
Éric Aeschimann - Libération (IHU On-line)
Tradução do artigo de Aeschimann (16/02/2008), publicada na revista IHU Online.Doença na democracia, nevoeiro nas urnas. É esse o efeito retardado de uma sucessão de escrutínios de resultados embaraçosos para a esquerda? Um movimento de humor diante da democracia liberal triunfal? Nova mania de alguns filósofos? Ou uma crise mais profunda? O fato está aí: a democracia, em todo o caso na sua forma eleitoral, está mal de saúde e os intelectuais vêm à sua cabeceira. Certamente para se perguntar pelo significado deste ataque de febre. Outros, mais radicais, para afirmar que, num mundo mais complexo e mais desigual que nunca, o sistema representativo não permite mais que a grande maioria participe da tomada de decisão coletiva e que se faz necessário se perguntar pelos próprios fundamentos.Punir os eleitos. Primeiramente, a constatação. Ela atravessa clivagens políticas. Vindos da esquerda antitotalitária, os historiadores das idéias soam o alarme. “A democracia eleitoral incontestavelmente erodiu”, escreveu Pierre Rosanvallon no final de 2006 em La Contre-Démocratie [A contra-democracia]. Próximo da segunda esquerda, ele descreveu as diversas formas da “desconfiança” democrática, da “democracia negativa”: abstenção, manifestações, vontade de vigiar e punir os eleitos. Na introdução do primeiro volume de L’Avènement de la démocratie [O advento da democracia], que apareceu no outono, seu colega Marcel Gauchet prefere falar de “uma anemia galopante”, de uma “perda de efetividade” que ele atribui a uma “crise de crescimento” de grande amplitude. A ironia quer que essas análises se desenvolvam num momento em que, praticamente em oposição ao campo de batalha intelectual, a crítica da “democracia formal”, tão velha quanto o marxismo, conhece uma segunda juventude.Testemunhando o inesperado sucesso do pequeno ensaio do filósofo Alain Badiou, De quoi Sarkozy est-il le nom ?, verdadeiro ataque da lei das urnas. “Todo o mundo percebe que a democracia eleitoral não é um espaço de escolha real”, escreve. Diante da “corrupção” das democracias pelas potências do dinheiro, teria chegado o momento de definir “uma nova prática daquilo que foi chamado de ‘ditadura’ (do proletariado). Ou ainda, e é a mesma coisa: um novo uso da palavra ‘Virtude’”.Muitas vozes se levantaram – as de Bernard-Henri Lévy ou do crítico literário Pierre Assouline – para denunciar o retorno de uma retórica associada ao comunismo estalinista. Michel Taubman, diretor da revista Le Meilleur des Mondes, suspeito de complacência para com o pensamento da esquerda, mostra uma certa tranqüilidade: “Há trinta anos, na França, 20% da população denunciava a democracia burguesa e acreditava na ditadura do proletariado. Vivemos com isso. Na realidade, esses intelectuais radicais não representam ninguém, porque, hoje, mesmo Besancenot defende a democracia eleitoral”. Portanto, que na França a discussão tome um aspecto tão enérgico não é casual. “Os franceses são, no contexto europeu, os mais pessimistas em relação à democracia e seus representantes”, nota Stéphane Rozès, diretor do Instituto CSA. A crise, diagnostica, é “espiritual” e ratifica o discurso da impotência dos políticos diante da mundialização.“Impotência”. Abstenção nas eleições presidenciais de 2002, vitória do ‘não’ à Constituição européia, “flechadas” tão bruscas quanto as efemérides pela Ségolène Royal depois François Bayrou, participação massiva na consagração de Nicolas Sarkozy, escrutínios locais transformados em ‘défouloirs’, a bússola fica desnorteada. Nem as extravagâncias sarkozianas nem a ratificação do mini-tratado europeu deverão contribuir para restaurar a confiança nas virtudes do voto. Algo para confortar Badiou, não enfastiado de constatar em seu livro: “A impotência era efetiva, mas agora ela é comprovada”.“Os franceses não reprovam nos políticos a sua falta de proximidade, mas sua irresponsabilidade”, retoma Rozès, acrescentando que os franceses são tão mais sensíveis nisso quanto seu viver em conjunto não está fundado sobre a religião ou a etnia, mas sobre a partilha dos ideais políticos. Resta colocar-se de acordo sobre as causas da impotência democrática. Este é o desafio da reflexão engajada. Para Marcel Gauchet, o acontecimento de uma concepção hipertrofiada dos direitos humanos acabou por privar a coletividade de todos os meios de ação. Patrick Braouzec, deputado comunista de Saint-Denis, pensa, ao contrário, que “ao lado das eleições, pelas quais as pessoas se interessam muito, mas que constituem um momento específico, a democracia só pode atrofiar se ela não se apoiar também sobre uma democracia participativa e sobre o movimento social”. Um “movimento social” de contornos fluidos – manifestações de rua, apoio às crianças indocumentadas, operações midiáticas das Crianças de Don Quixote... – e que, levado ao extremo, lembra o título de um livro do filósofo John Holloway, em voga entre os altermundistas: Mudar o mundo sem tomar o poder [São Paulo: Viramundo, 2003]. Fazer política, acordos, mas fora das urnas.O filósofo Slavoj Zizek, estrela do campus americano e habituado às brincadeiras provocadoras, vai ainda mais longe ao estimar que só “a violência popular” permitirá às classes desfavorecidas se fazerem ouvir nas democracias liberais. Zizek publica este mês na França uma coletânea dos “mais belos discursos de Robespierre”, precedido de uma longa introdução em que se pergunta como “reinventar um terror emancipatório”. Ícone da pop-filosofia, conhecida primeiramente por suas análises do cinema hollywoodiano, o homem é, portanto, o contrário de um nostálgico. Nos tempos do “socialismo real” lutou na Iugoslávia titista e participou dos primeiros passos da democracia eslovena. Sua radicalização parece mostrar que o desencantamento democrático não pode ser reduzido a uma exceção francesa.“Arrogância ocidental”. É que, um pouco por todo o mundo, os processos de democratização conhecem malogros de diversas ordens que pioram a “promoção da democracia”, para retomar o vocabulário em uso na ONU desde os anos 90: o Iraque e o Afeganistão, mas também a Rússia onde Putin recupera o poder, a Argélia ou a Palestina onde os islâmicos viram confiscar suas vitórias obtidas pelas urnas. Ou ainda, o crescimento dos populismos na Polônia, na Dinamarca, na Bélgica. Até mesmo uma América que, para impor a democracia, não hesitou em transgredir os princípios elementares do direito. No número de janeiro da Revista Esprit, Pierre Rosanvallon apontava “uma certa arrogância ocidental e uma certa cegueira em relação à natureza e aos problemas da democracia”.Tradução: Cepat
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O fantasma que vaga no pensamento único
O fantasma que vaga no pensamento único
Vaga e insossa, mas presencialista, a democracia parece ser quase o horizonte insuperável da nossa época. A saturação provocada pelo seu uso indiscriminado justifica a peremptoriedade dessa afirmação. De Barack Obama a Berlusconi, das filosofias políticas radicais ao Hamas e ao Vaticano, todos parecem ter uma opinião sobre aquilo que a democracia é e sobre aquilo que ela deveria ser. O artigo é de Roberto Ciccarelli, publicado no jornal Il Manifesto e traduzido pela revista IHU On-line.
Roberto Ciccarelli - Il Manifesto (IHU On-line)
Tradução publicada no site da revista IHU On-Line.Em um livro recente, "Démocratie, dans quel état?" (La Fabrique, 152p.), que reúne contribuições de Giorgio Agamben, Alain Badiou, Wendy Brown, Jean-Luc Nancy, Jacques Rancière e Slavoj Zizek, dentre outros, defende-se que a desagregação dos conteúdos normativos da democracia foi gerada por uma oscilação entre regime e governo, entre soberania popular e gestão econômica e administrativa daquilo que existe. A democracia em que vivemos seria uma democracia "governamental", que impõe a busca de uma alternativa. Se esse é o objetivo, então não é por acaso a escolha das contribuições que compõem esse livro, escrito por autores considerados protagonistas de uma "reviravolta" no pensamento político contemporâneo, a da chamada "democracia radical".Os assuntos da cidadeMuitas vezes, o logotipo não é justo com a diversidade – às vezes enorme –de um fenômeno cultural, mas só às exigências do mercado editorial. Porém, pelo menos nesse caso, isso explica mais uma vez que o liberalismo ostentado pela "intelligentzia" a partir dos anos 80 é uma doutrina consumada. Por isso, é compreensível a ansiedade por novos paradigmas, mas isso não deveria remover as diferenças essenciais entre os seus protagonistas.É notável como a busca de uma alternativa parou diante da impossibilidade de criar um sujeito político "forte". A crítica da democracia propõe uma outra estratégia para recompor esse sujeito para além dos limites da política do século XIX, fundada sobre as classes ou sobre o individualismo proprietário. Além das muitas diferenças, é justamente esse o projeto que surge do grupo que enfileira a "vida nua" de Agamben, a via "neoleninista" Zizek até a "hipótese comunista" de Badiou.Jacques Rancière A contribuição de Rancière, que dá sequência às considerações já desenvolvidas em "L'odio per la democrazia" (Cronopio) e em "Il disaccordo" (Meltemi), oferece motivos para se repensar e se concentra sobre o problema central desse grupo. Parece, de fato, que a teoria radical acha difícil imaginar uma subjetividade politicamente eficaz. Por uma dupla razão: de um lado, descreve a democracia como negatividade absoluta, como "significante vazio". De outro, evoca um antagonismo político permanente contra a ordem constituída. A democracia seria, assim, o resultado de uma contínua ruptura do espaço político, cujo objetivo é a destituição da sua legitimidade, mais do que a realização das possibilidades que ela exclui.A real continuidade entre Agamben, Badiou ou Zizek não é a da continuidade contingente que localiza no modelo antagônico um relato alternativo à democracia liberal, mas sim a da vontade de atribuir ao "político" um princípio único e puro. Só que, nesses autores, a pureza nunca se dá em uma forma particular da democracia, mas na sua contínua negação. Se não fosse assim, a democracia reproduziria a confusão entre a democracia e a constituição, ou uma forma social que, para Rancière, aproxima todo o arco político da direita à extrema esquerda. Com o resultado espectral – mas nunca tão atual – de identificar a vida de uma democracia com a permanente reforma das regras que deveriam governá-la."A democracia – escreve Rancière – é o poder daqueles que não têm nenhum título para exercer o poder, a capacidade de que qualquer um se ocupe dos assuntos da cidade". É esse o seu "escândalo": "qualquer um", cidadão ou migrante, pode aspirar ao governo. Uma pretensão que nutre o ódio dos governantes, mas que também é a demonstração de que aquele que governa não tem nenhuma razão natural para fazê-lo, e aquele que é governado não tem nenhuma razão natural para obedecer.Uma política é democrática quando reconhece estar fundada nessa divisão não natural dos papéis. Fazendo isso, ela alimenta uma contínua renegociação dos limites do público e do privado, do político e do social, do econômico e do institucional, para resolver as desigualdades existentes, salvo se forem registradas outras novas em outros lugares.Além do governo dos melhoresAs considerações justas de Rancière ainda deixam uma dúvida. A sua versão da política democrática reavalia o aspecto constituinte do conflito, enquanto produtor de uma distribuição igualitária dos papéis contra a lógica hierárquica da democracia. O ponto é que esse conflito ocorre desde a polis grega, em uma espaço político que é sempre igual a si mesmo e, por isso, não é muito diferente do formalismo jurídico do qual toma distância.Contrariamente ao que Michel Foucault defende, que forneceu uma versão imanente da política democrática fundada na diferença e não na igualdade, a negatividade transcendental, que Rancière critica enquanto expressão das aporias do antagonismo democrata-radical, permanece também no seu sistema. Mesmo tendo identificado o lugar em que se desenvolve o conflito da democracia – a repartição dos papéis entre governantes e governados –, ele não explica como se forma o conflito e por que seria diferente dos anteriores.Distante de uma visão trágica da política como "decisionismo" ou, pior, como técnica administrativa, o pensamento de Rancière denuncia a tentação elitista difundida na cultura política contemporânea, para a qual a democracia é naturalmente o "governo dos melhores". Mas não foge do problema, este sim epocal, de como tornar efetivo o sujeito da política democrática.Personagens e palavras-chaves de um pensamento crítico a ser reconstruídoLouis Gabriel Gauny, engenheiro e filósofo, em "Le philosophe plébéien" (La Découverte), e Étienne Cabet, utopista século XIX, em "La nuit de proletaires. Archives du rêve ouvrier" (Hachette), são os personagens que, junto com Joseph Jacotot, povoam o singular arquivo a partir do qual Jacques Rancière indagou o estatuto filosófico do discurso histórico, propondo "Courts voyages au pays du peuple" (Seuil) e "Les mots de l'histoire" (Seuil).A seguir, Rancière passou a uma reflexão sobre a literatura ("Mallarmé o la politica della sirena", Clueb) e sobre o cinema ("La favola cinematografica", Ets, e "Le spectateur émancipé", La Fabrique).Conhecido na Itália por ter se afastado de Louis Althusser por divergências sobre o Maio de 68, depois de ter participado dos seminários de 1965 sobre "Leggere il Capitale" (Mimesis), Rancière, professor da Universidade Paris VIII (Saint Denis) é um protagonista do debate filosófico e político com livros como "Il disaccordo" (Meltemi) e "L'odio per la democrazia" (Cronopio).A tradução é de Moisés Sbardelotto.
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Vaga e insossa, mas presencialista, a democracia parece ser quase o horizonte insuperável da nossa época. A saturação provocada pelo seu uso indiscriminado justifica a peremptoriedade dessa afirmação. De Barack Obama a Berlusconi, das filosofias políticas radicais ao Hamas e ao Vaticano, todos parecem ter uma opinião sobre aquilo que a democracia é e sobre aquilo que ela deveria ser. O artigo é de Roberto Ciccarelli, publicado no jornal Il Manifesto e traduzido pela revista IHU On-line.
Roberto Ciccarelli - Il Manifesto (IHU On-line)
Tradução publicada no site da revista IHU On-Line.Em um livro recente, "Démocratie, dans quel état?" (La Fabrique, 152p.), que reúne contribuições de Giorgio Agamben, Alain Badiou, Wendy Brown, Jean-Luc Nancy, Jacques Rancière e Slavoj Zizek, dentre outros, defende-se que a desagregação dos conteúdos normativos da democracia foi gerada por uma oscilação entre regime e governo, entre soberania popular e gestão econômica e administrativa daquilo que existe. A democracia em que vivemos seria uma democracia "governamental", que impõe a busca de uma alternativa. Se esse é o objetivo, então não é por acaso a escolha das contribuições que compõem esse livro, escrito por autores considerados protagonistas de uma "reviravolta" no pensamento político contemporâneo, a da chamada "democracia radical".Os assuntos da cidadeMuitas vezes, o logotipo não é justo com a diversidade – às vezes enorme –de um fenômeno cultural, mas só às exigências do mercado editorial. Porém, pelo menos nesse caso, isso explica mais uma vez que o liberalismo ostentado pela "intelligentzia" a partir dos anos 80 é uma doutrina consumada. Por isso, é compreensível a ansiedade por novos paradigmas, mas isso não deveria remover as diferenças essenciais entre os seus protagonistas.É notável como a busca de uma alternativa parou diante da impossibilidade de criar um sujeito político "forte". A crítica da democracia propõe uma outra estratégia para recompor esse sujeito para além dos limites da política do século XIX, fundada sobre as classes ou sobre o individualismo proprietário. Além das muitas diferenças, é justamente esse o projeto que surge do grupo que enfileira a "vida nua" de Agamben, a via "neoleninista" Zizek até a "hipótese comunista" de Badiou.Jacques Rancière A contribuição de Rancière, que dá sequência às considerações já desenvolvidas em "L'odio per la democrazia" (Cronopio) e em "Il disaccordo" (Meltemi), oferece motivos para se repensar e se concentra sobre o problema central desse grupo. Parece, de fato, que a teoria radical acha difícil imaginar uma subjetividade politicamente eficaz. Por uma dupla razão: de um lado, descreve a democracia como negatividade absoluta, como "significante vazio". De outro, evoca um antagonismo político permanente contra a ordem constituída. A democracia seria, assim, o resultado de uma contínua ruptura do espaço político, cujo objetivo é a destituição da sua legitimidade, mais do que a realização das possibilidades que ela exclui.A real continuidade entre Agamben, Badiou ou Zizek não é a da continuidade contingente que localiza no modelo antagônico um relato alternativo à democracia liberal, mas sim a da vontade de atribuir ao "político" um princípio único e puro. Só que, nesses autores, a pureza nunca se dá em uma forma particular da democracia, mas na sua contínua negação. Se não fosse assim, a democracia reproduziria a confusão entre a democracia e a constituição, ou uma forma social que, para Rancière, aproxima todo o arco político da direita à extrema esquerda. Com o resultado espectral – mas nunca tão atual – de identificar a vida de uma democracia com a permanente reforma das regras que deveriam governá-la."A democracia – escreve Rancière – é o poder daqueles que não têm nenhum título para exercer o poder, a capacidade de que qualquer um se ocupe dos assuntos da cidade". É esse o seu "escândalo": "qualquer um", cidadão ou migrante, pode aspirar ao governo. Uma pretensão que nutre o ódio dos governantes, mas que também é a demonstração de que aquele que governa não tem nenhuma razão natural para fazê-lo, e aquele que é governado não tem nenhuma razão natural para obedecer.Uma política é democrática quando reconhece estar fundada nessa divisão não natural dos papéis. Fazendo isso, ela alimenta uma contínua renegociação dos limites do público e do privado, do político e do social, do econômico e do institucional, para resolver as desigualdades existentes, salvo se forem registradas outras novas em outros lugares.Além do governo dos melhoresAs considerações justas de Rancière ainda deixam uma dúvida. A sua versão da política democrática reavalia o aspecto constituinte do conflito, enquanto produtor de uma distribuição igualitária dos papéis contra a lógica hierárquica da democracia. O ponto é que esse conflito ocorre desde a polis grega, em uma espaço político que é sempre igual a si mesmo e, por isso, não é muito diferente do formalismo jurídico do qual toma distância.Contrariamente ao que Michel Foucault defende, que forneceu uma versão imanente da política democrática fundada na diferença e não na igualdade, a negatividade transcendental, que Rancière critica enquanto expressão das aporias do antagonismo democrata-radical, permanece também no seu sistema. Mesmo tendo identificado o lugar em que se desenvolve o conflito da democracia – a repartição dos papéis entre governantes e governados –, ele não explica como se forma o conflito e por que seria diferente dos anteriores.Distante de uma visão trágica da política como "decisionismo" ou, pior, como técnica administrativa, o pensamento de Rancière denuncia a tentação elitista difundida na cultura política contemporânea, para a qual a democracia é naturalmente o "governo dos melhores". Mas não foge do problema, este sim epocal, de como tornar efetivo o sujeito da política democrática.Personagens e palavras-chaves de um pensamento crítico a ser reconstruídoLouis Gabriel Gauny, engenheiro e filósofo, em "Le philosophe plébéien" (La Découverte), e Étienne Cabet, utopista século XIX, em "La nuit de proletaires. Archives du rêve ouvrier" (Hachette), são os personagens que, junto com Joseph Jacotot, povoam o singular arquivo a partir do qual Jacques Rancière indagou o estatuto filosófico do discurso histórico, propondo "Courts voyages au pays du peuple" (Seuil) e "Les mots de l'histoire" (Seuil).A seguir, Rancière passou a uma reflexão sobre a literatura ("Mallarmé o la politica della sirena", Clueb) e sobre o cinema ("La favola cinematografica", Ets, e "Le spectateur émancipé", La Fabrique).Conhecido na Itália por ter se afastado de Louis Althusser por divergências sobre o Maio de 68, depois de ter participado dos seminários de 1965 sobre "Leggere il Capitale" (Mimesis), Rancière, professor da Universidade Paris VIII (Saint Denis) é um protagonista do debate filosófico e político com livros como "Il disaccordo" (Meltemi) e "L'odio per la democrazia" (Cronopio).A tradução é de Moisés Sbardelotto.
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A crise financeira atual e a crítica de esquerda hoje
A crise financeira atual e a crítica de esquerda hoje
Lançamento da Fundação Perseu Abramo, o livro "O abc da crise" cumpre uma dupla tarefa: organiza os diagnósticos e sintetiza os prognósticos feitos pela esquerda no ato da crise, de maneira que o livro se torna útil tanto como instrumento pedagógico quanto como ferramenta política para quem quer que se interesse por certo pensamento crítico e contemporâneo. Trata-se de um conjunto representativo das opiniões não-liberais acerca da crise financeira escritas no calor da hora. O artigo é de William Vella Nozaki.
William Vella Nozaki (*)
Muito já se comentou sobre o laço – etimológico e histórico – entre as palavras crise e crítica. E, embora a crítica seja muitas vezes acusada de inventar crises inexistentes, nem sempre as crises são acompanhadas de críticas eficientes. De maneira que, no turbilhão de publicações oportunistas e salvacionistas sobre a crise financeira atual merece destaque o livro: "O abc da crise", organizado por Sérgio Sister e publicado pela Fundação Perseu Abramo. Trata-se de um conjunto representativo das opiniões não-liberais acerca da crise financeira escritas no calor da hora. Como tal, trazem nas linhas o ímpeto de uma crítica mais conjuntural e de curto-prazo e carregam nas entrelinhas a tentativa de uma análise mais estrutural e de longo-prazo, dois traços peculiares das leituras progressistas e heterodoxas. Nesse sentido, esse Abc da crise cumpre uma dupla tarefa: organiza os diagnósticos e sintetiza os prognósticos feitos pela esquerda no ato da crise, de maneira que o livro se torna útil tanto como instrumento pedagógico quanto como ferramenta política para quem quer que se interesse por certo pensamento crítico e contemporâneo.O livro é composto por uma série de artigos e entrevistas, inéditos ou já conhecidos, oriundos tanto do debate intelectual (nacional e internacional) quanto do cenário político (partidário e governamental).Causas e conseqüências Nessa divisão intelectual da crítica, o texto que dá nome ao livro, assinado por Jefferson José da Conceição, e produzido coletivamente no âmbito do Dieese, apresenta uma descrição esquemática e articulada das dimensões estrutural e conjuntural da crise. Resgatando os antecedentes econômicos, políticos e ideológicos, o texto concatena a avanço da globalização e a expansão do neoliberalismo aos processos de abertura comercial, liberalização financeira e desregulamentação da proteção social assim como dos direitos trabalhistas. O objetivo é evidenciar como todos esses fatores se somam e concorrem produzindo uma associação perigosa entre bancos nacionais e finanças internacionais, dando margem a todo tipo de criatividade irresponsável no trato com o dinheiro público e privado.Aliás, o efeito em cadeia que converte um problema no setor imobiliário norte-americano em um problema no sistema bancário e creditício dando origem a uma crise financeira internacional não pode ser fruto senão dessa constelação de fatores, nos lembra o autor.Logo ficou claro como a quebra dos bancos norte-americanos e europeus significaria corte em créditos e investimentos no mundo todo, e que a recessão que se seguiria nos países centrais acabaria produzindo um efeito dominó para o resto do mundo, retraindo o comércio e encolhendo a produção, ensejando desemprego e reduções salariais.No mesmo caminho segue o artigo do organizador do livro, Sérgio Sister, que aponta por trás da crise a transição de uma macroeconomia da poupança para uma macroeconomia do endividamento. O texto de Jefferson José apresenta ainda uma proposta de atuação para os trabalhadores do país, enquanto a artigo de Sérgio Sister avança discutindo as conseqüências possíveis da crise sobre a economia brasileira.Superprodução e financeirizaçãoCoube a Paul Krugman, em uma quadra de artigos publicados originalmente no New York Times, após o setembro negro de 2008, analisar a crise desde dentro, a partir dos EUA. O economista norte-americano revela que a crise dava indícios de sua eclosão há pelo menos uma década, desde a última bolha das pontocom e do primeiro colapso de um grande fundo de hedge, entre 1997 e 1998. O autor nos lembra como nessas duas ocasiões a maioria dos economistas e analistas de mercado se apressou em comemorar a saída da beira da crise, esquecendo-se de indagar como a economia internacional havia chegado tão perto dela.Mas por que o establishment tardou em perceber a aproximação e a eclosão dessa crise? A resposta dada por Paul Krugman a essa questão leva em consideração dois fatores. Em primeiro lugar, ideólogos do neoliberalismo norte-americano, como Alan Greenspan, Robert Rubin e Lawrence Summers, sempre apostaram na desregulamentação em detrimento da fiscalização do mercado financeiro. Em segundo lugar, e como decorrência desse laissez-faire, o avanço de um sistema bancário “sombra”, “paralelo”, nucleado por bancos de investimento, cercado por fundos e seguradoras aparecia para esses policy makers menos como problema e mais como solução, de maneira que a oferta desabrida de novos serviços financeiros foi encarada como inovação e não como abuso, do mesmo modo a expansão irrestrita do crédito foi percebida como avanço e não como perigo, para Paul Krugman uma verdadeira bancocracia tomou de assalto o Estado e a economia norte-americanas com o consentimento e a cumplicidade entre tecnocratas e financistas. Os artigos do economista norte-americano oferecem uma visão conjuntural e nacional bastante lúcida para a crise financeira, mas, preocupado que está com a urgência e a necessidade de uma reforma financeira, o autor não ousa uma análise estrutural de maior fôlego, tarefa que fica a cargo dos intérpretes brasileiros da crise.O artigo de Paul Singer e a entrevista de Francisco de Oliveira podem ser lidos em conjunto. Enquanto o economista interpreta a crise financeira como mais um dos momentos cíclicos da história do capitalismo em que ocorre o esgotamento da demanda, o sociólogo complementa avisando que estamos diante de uma crise da globalização do capital, cuja intensidade está em repor o problema de realização do valor. Ou seja, para os dois autores, o descompasso entre a expansão da produtividade e a redução da capacidade de absorção de mercadorias engendrou uma situação em que, a despeito da ampliação da mais-valia global, o consumo das massas não acompanhou a massa de produtos colocados em circulação. Enquanto Paul Singer reconstrói, teoricamente, os laços entre a esfera produtiva e a esfera financeira, apontando complementaridades e contradições entre, de um lado, mercadorias reais, valores concretos, bens e serviços e, de outro lado, ativos virtuais, valores monetários, créditos e dívidas, Francisco de Oliveira demonstra, empiricamente, como a aliança entre o crescimento industrial de países como China e Índia e a expansão monetária dos EUA contribuiu para a alteração nos padrões de acumulação e consumo. Um dos sintomas dessa mudança se revela, justamente, na especialização financeira que conduziu ao financiamento imobiliário irrestrito e à especulação fundiária exacerbada no mercado norte-americano. Partindo de uma tese distinta das duas anteriores, as notas de Maria da Conceição Tavares e os textos de Luiz Gonzaga Belluzzo enfatizam os tropeços criados para a circulação do crédito e os empecilhos causados pelo obscurantismo das inovações financeiras, dando origem a uma espécie de financeirização da economia.Luiz Gonzaga Belluzzo ressalta como no capitalismo – uma economia monetária mais do que industrial – deve-se atentar menos para o princípio do aumento da produtividade e mais para a finalidade da acumulação de riqueza. Nesse sentido, a compreensão dessa crise situa-se antes na esfera financeira do que na produtiva. A separação entre os bancos comerciais, que recebem depósitos e realizam empréstimos, e que portanto são agentes econômicos que compram ativos para si e para terceiros, e os bancos de investimento, que se dedicam ao aconselhamento de empresas nas emissões e na gestão de títulos e ações, e que portanto são agentes econômicos que vendem ativos, criou uma espécie de esquizofrenia que está na origem dos supermercados financeiros e da securitização dos créditos que desaguaram na crise financeira atual. A preferência pela liquidez e a instabilidade financeira são características do capitalismo que se desvelam no cenário de hoje.De quebra o autor esboça um ensaio sobre as implicações subjetivas de uma visão de mundo que, baseada no individualismo racional e maximizador de utilidade acaba engendrando a concorrência e a predação que estão na origem de comportamentos arriscados e inseguros que conduzem à crises cíclicas e periódicas.Estado e políticasA despeito das divergências entre os intérpretes, todos concordam em um ponto, sintetizado por Carlos Eduardo Carvalho, o neoliberalismo pretendeu substituir a política pela economia e reduzir a economia às finanças, o que ele escondia, entretanto, era uma atuação em favor dos grupos mais influentes do capital e o que ele revela, agora, é uma comunhão entre Estado e mercado.Se, por um lado, é verdade que a crise reabilitou as possibilidades de intervenção estatal, por outro lado, é apressado deduzir que isso signifique o fim do neoliberalismo. Afinal, a principal forma de intervenção tem sido a injeção de liquidez que é, na realidade, uma emissão de dinheiro público a serviço das altas finanças e não da população em geral. No que se refere ao Brasil, Cézar Manoel de Medeiros ressalta a importância do setor público no combate à crise, pois, além das reservas internacionais e da conquista do investment grade, temos três bancos estatais (BB, CEF e BNDES) e duas grandes empresas públicas (Petrobrás e Eletrobrás) que podem, e devem, atuar na expansão do crédito e do investimento. O autor aproveita ainda para ressaltar a importância do projeto do pré-sal como estratégia nacional de defesa e apresentar a proposta de criação de uma Empresa Nacional de Ativos (Probr ou Probrasil), concentrando as ações ordinárias e preferenciais de propriedade da União.Vale ainda ressaltar que, enquanto o espírito anti-FHC fica a cargo de Ricardo Berzoini (presidente do PT), o escudo pró-Lula compete a Guido Mantega (Ministro da Fazenda).Enquanto o primeiro relembra as diretrizes macroeconômicas que filiaram o Brasil ao neoliberalismo, patrocinando a vulnerabilidade comercial, a fragilidade financeira e a desestruturação do Estado, o segundo destaca as medidas que, supostamente, tornaram o Brasil mais forte para suportar a crise, com destaque para o crescimento do PIB e os investimento do PAC, além das medidas de curto-prazo para contornar a falta de recursos externos e para sustentar a atividade econômica interna. Se, porque excessivamente político-partidários, os textos não fornecem uma visão analítica mais acurada da crise, ao menos servem como documentos que sistematizam as idéias e decisões do governo brasileiro para combatê-la. InconclusõesTalvez seja cedo demais para que se possa avaliar com precisão o sentido e o significado dessa crise. Tal fato, entretanto, não deve desencorajar as tentativas de compreensão, até mesmo porque, como se sabe, os momentos de crise abrem vagas de incerteza e indeterminação capazes de aproximar a explicação da intervenção. Por trás das tentativas de interpretação reunidas no "Abc da crise", o que se revela são questões sobre a relação entre as esferas produtiva e financeira, entre Estado e mercado, entre a globalização e o neoliberalismo. Abrindo possibilidades de análise sem pressa de concluí-las, ao final da leitura o que se experimenta são muitas dúvidas e uma única certeza, como bem expressa Márcio Pochmann: a de que vivemos um momento de transição. Resta pensar em que nova promessa de modernização iremos nos apegar, e se ela será capaz de realizar o ideal civilizatório que até aqui não conseguimos levar a bom termo. (*) Bacharel em Ciências Sociais (FFLCH/USP); mestrando em Desenvolvimento Econômico, área de concentração: História Econômica (IE/UNICAMP). E-mail: willnozaki@gmail.com.
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16095
Lançamento da Fundação Perseu Abramo, o livro "O abc da crise" cumpre uma dupla tarefa: organiza os diagnósticos e sintetiza os prognósticos feitos pela esquerda no ato da crise, de maneira que o livro se torna útil tanto como instrumento pedagógico quanto como ferramenta política para quem quer que se interesse por certo pensamento crítico e contemporâneo. Trata-se de um conjunto representativo das opiniões não-liberais acerca da crise financeira escritas no calor da hora. O artigo é de William Vella Nozaki.
William Vella Nozaki (*)
Muito já se comentou sobre o laço – etimológico e histórico – entre as palavras crise e crítica. E, embora a crítica seja muitas vezes acusada de inventar crises inexistentes, nem sempre as crises são acompanhadas de críticas eficientes. De maneira que, no turbilhão de publicações oportunistas e salvacionistas sobre a crise financeira atual merece destaque o livro: "O abc da crise", organizado por Sérgio Sister e publicado pela Fundação Perseu Abramo. Trata-se de um conjunto representativo das opiniões não-liberais acerca da crise financeira escritas no calor da hora. Como tal, trazem nas linhas o ímpeto de uma crítica mais conjuntural e de curto-prazo e carregam nas entrelinhas a tentativa de uma análise mais estrutural e de longo-prazo, dois traços peculiares das leituras progressistas e heterodoxas. Nesse sentido, esse Abc da crise cumpre uma dupla tarefa: organiza os diagnósticos e sintetiza os prognósticos feitos pela esquerda no ato da crise, de maneira que o livro se torna útil tanto como instrumento pedagógico quanto como ferramenta política para quem quer que se interesse por certo pensamento crítico e contemporâneo.O livro é composto por uma série de artigos e entrevistas, inéditos ou já conhecidos, oriundos tanto do debate intelectual (nacional e internacional) quanto do cenário político (partidário e governamental).Causas e conseqüências Nessa divisão intelectual da crítica, o texto que dá nome ao livro, assinado por Jefferson José da Conceição, e produzido coletivamente no âmbito do Dieese, apresenta uma descrição esquemática e articulada das dimensões estrutural e conjuntural da crise. Resgatando os antecedentes econômicos, políticos e ideológicos, o texto concatena a avanço da globalização e a expansão do neoliberalismo aos processos de abertura comercial, liberalização financeira e desregulamentação da proteção social assim como dos direitos trabalhistas. O objetivo é evidenciar como todos esses fatores se somam e concorrem produzindo uma associação perigosa entre bancos nacionais e finanças internacionais, dando margem a todo tipo de criatividade irresponsável no trato com o dinheiro público e privado.Aliás, o efeito em cadeia que converte um problema no setor imobiliário norte-americano em um problema no sistema bancário e creditício dando origem a uma crise financeira internacional não pode ser fruto senão dessa constelação de fatores, nos lembra o autor.Logo ficou claro como a quebra dos bancos norte-americanos e europeus significaria corte em créditos e investimentos no mundo todo, e que a recessão que se seguiria nos países centrais acabaria produzindo um efeito dominó para o resto do mundo, retraindo o comércio e encolhendo a produção, ensejando desemprego e reduções salariais.No mesmo caminho segue o artigo do organizador do livro, Sérgio Sister, que aponta por trás da crise a transição de uma macroeconomia da poupança para uma macroeconomia do endividamento. O texto de Jefferson José apresenta ainda uma proposta de atuação para os trabalhadores do país, enquanto a artigo de Sérgio Sister avança discutindo as conseqüências possíveis da crise sobre a economia brasileira.Superprodução e financeirizaçãoCoube a Paul Krugman, em uma quadra de artigos publicados originalmente no New York Times, após o setembro negro de 2008, analisar a crise desde dentro, a partir dos EUA. O economista norte-americano revela que a crise dava indícios de sua eclosão há pelo menos uma década, desde a última bolha das pontocom e do primeiro colapso de um grande fundo de hedge, entre 1997 e 1998. O autor nos lembra como nessas duas ocasiões a maioria dos economistas e analistas de mercado se apressou em comemorar a saída da beira da crise, esquecendo-se de indagar como a economia internacional havia chegado tão perto dela.Mas por que o establishment tardou em perceber a aproximação e a eclosão dessa crise? A resposta dada por Paul Krugman a essa questão leva em consideração dois fatores. Em primeiro lugar, ideólogos do neoliberalismo norte-americano, como Alan Greenspan, Robert Rubin e Lawrence Summers, sempre apostaram na desregulamentação em detrimento da fiscalização do mercado financeiro. Em segundo lugar, e como decorrência desse laissez-faire, o avanço de um sistema bancário “sombra”, “paralelo”, nucleado por bancos de investimento, cercado por fundos e seguradoras aparecia para esses policy makers menos como problema e mais como solução, de maneira que a oferta desabrida de novos serviços financeiros foi encarada como inovação e não como abuso, do mesmo modo a expansão irrestrita do crédito foi percebida como avanço e não como perigo, para Paul Krugman uma verdadeira bancocracia tomou de assalto o Estado e a economia norte-americanas com o consentimento e a cumplicidade entre tecnocratas e financistas. Os artigos do economista norte-americano oferecem uma visão conjuntural e nacional bastante lúcida para a crise financeira, mas, preocupado que está com a urgência e a necessidade de uma reforma financeira, o autor não ousa uma análise estrutural de maior fôlego, tarefa que fica a cargo dos intérpretes brasileiros da crise.O artigo de Paul Singer e a entrevista de Francisco de Oliveira podem ser lidos em conjunto. Enquanto o economista interpreta a crise financeira como mais um dos momentos cíclicos da história do capitalismo em que ocorre o esgotamento da demanda, o sociólogo complementa avisando que estamos diante de uma crise da globalização do capital, cuja intensidade está em repor o problema de realização do valor. Ou seja, para os dois autores, o descompasso entre a expansão da produtividade e a redução da capacidade de absorção de mercadorias engendrou uma situação em que, a despeito da ampliação da mais-valia global, o consumo das massas não acompanhou a massa de produtos colocados em circulação. Enquanto Paul Singer reconstrói, teoricamente, os laços entre a esfera produtiva e a esfera financeira, apontando complementaridades e contradições entre, de um lado, mercadorias reais, valores concretos, bens e serviços e, de outro lado, ativos virtuais, valores monetários, créditos e dívidas, Francisco de Oliveira demonstra, empiricamente, como a aliança entre o crescimento industrial de países como China e Índia e a expansão monetária dos EUA contribuiu para a alteração nos padrões de acumulação e consumo. Um dos sintomas dessa mudança se revela, justamente, na especialização financeira que conduziu ao financiamento imobiliário irrestrito e à especulação fundiária exacerbada no mercado norte-americano. Partindo de uma tese distinta das duas anteriores, as notas de Maria da Conceição Tavares e os textos de Luiz Gonzaga Belluzzo enfatizam os tropeços criados para a circulação do crédito e os empecilhos causados pelo obscurantismo das inovações financeiras, dando origem a uma espécie de financeirização da economia.Luiz Gonzaga Belluzzo ressalta como no capitalismo – uma economia monetária mais do que industrial – deve-se atentar menos para o princípio do aumento da produtividade e mais para a finalidade da acumulação de riqueza. Nesse sentido, a compreensão dessa crise situa-se antes na esfera financeira do que na produtiva. A separação entre os bancos comerciais, que recebem depósitos e realizam empréstimos, e que portanto são agentes econômicos que compram ativos para si e para terceiros, e os bancos de investimento, que se dedicam ao aconselhamento de empresas nas emissões e na gestão de títulos e ações, e que portanto são agentes econômicos que vendem ativos, criou uma espécie de esquizofrenia que está na origem dos supermercados financeiros e da securitização dos créditos que desaguaram na crise financeira atual. A preferência pela liquidez e a instabilidade financeira são características do capitalismo que se desvelam no cenário de hoje.De quebra o autor esboça um ensaio sobre as implicações subjetivas de uma visão de mundo que, baseada no individualismo racional e maximizador de utilidade acaba engendrando a concorrência e a predação que estão na origem de comportamentos arriscados e inseguros que conduzem à crises cíclicas e periódicas.Estado e políticasA despeito das divergências entre os intérpretes, todos concordam em um ponto, sintetizado por Carlos Eduardo Carvalho, o neoliberalismo pretendeu substituir a política pela economia e reduzir a economia às finanças, o que ele escondia, entretanto, era uma atuação em favor dos grupos mais influentes do capital e o que ele revela, agora, é uma comunhão entre Estado e mercado.Se, por um lado, é verdade que a crise reabilitou as possibilidades de intervenção estatal, por outro lado, é apressado deduzir que isso signifique o fim do neoliberalismo. Afinal, a principal forma de intervenção tem sido a injeção de liquidez que é, na realidade, uma emissão de dinheiro público a serviço das altas finanças e não da população em geral. No que se refere ao Brasil, Cézar Manoel de Medeiros ressalta a importância do setor público no combate à crise, pois, além das reservas internacionais e da conquista do investment grade, temos três bancos estatais (BB, CEF e BNDES) e duas grandes empresas públicas (Petrobrás e Eletrobrás) que podem, e devem, atuar na expansão do crédito e do investimento. O autor aproveita ainda para ressaltar a importância do projeto do pré-sal como estratégia nacional de defesa e apresentar a proposta de criação de uma Empresa Nacional de Ativos (Probr ou Probrasil), concentrando as ações ordinárias e preferenciais de propriedade da União.Vale ainda ressaltar que, enquanto o espírito anti-FHC fica a cargo de Ricardo Berzoini (presidente do PT), o escudo pró-Lula compete a Guido Mantega (Ministro da Fazenda).Enquanto o primeiro relembra as diretrizes macroeconômicas que filiaram o Brasil ao neoliberalismo, patrocinando a vulnerabilidade comercial, a fragilidade financeira e a desestruturação do Estado, o segundo destaca as medidas que, supostamente, tornaram o Brasil mais forte para suportar a crise, com destaque para o crescimento do PIB e os investimento do PAC, além das medidas de curto-prazo para contornar a falta de recursos externos e para sustentar a atividade econômica interna. Se, porque excessivamente político-partidários, os textos não fornecem uma visão analítica mais acurada da crise, ao menos servem como documentos que sistematizam as idéias e decisões do governo brasileiro para combatê-la. InconclusõesTalvez seja cedo demais para que se possa avaliar com precisão o sentido e o significado dessa crise. Tal fato, entretanto, não deve desencorajar as tentativas de compreensão, até mesmo porque, como se sabe, os momentos de crise abrem vagas de incerteza e indeterminação capazes de aproximar a explicação da intervenção. Por trás das tentativas de interpretação reunidas no "Abc da crise", o que se revela são questões sobre a relação entre as esferas produtiva e financeira, entre Estado e mercado, entre a globalização e o neoliberalismo. Abrindo possibilidades de análise sem pressa de concluí-las, ao final da leitura o que se experimenta são muitas dúvidas e uma única certeza, como bem expressa Márcio Pochmann: a de que vivemos um momento de transição. Resta pensar em que nova promessa de modernização iremos nos apegar, e se ela será capaz de realizar o ideal civilizatório que até aqui não conseguimos levar a bom termo. (*) Bacharel em Ciências Sociais (FFLCH/USP); mestrando em Desenvolvimento Econômico, área de concentração: História Econômica (IE/UNICAMP). E-mail: willnozaki@gmail.com.
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sexta-feira, 31 de julho de 2009
As opções muito limitadas de Obama
As opções muito limitadas de Obama
Obama tem sofrido pressões consideráveis, principalmente das forças conservadoras dentro dos Estados Unidos, para assumir uma posição "mais dura" sobre as eleições iranianas e em outros temas. O que pode um presidente fazer? Refugiar-se na famosa citação de John F. Kennedy, uma citação que Obama fez mais que uma vez: "Não devemos nunca negociar por medo, mas nunca devemos ter medo de negociar." Isto não quer dizer que o presidente dos EUA seja impotente. Significa apenas que o melhor que pode fazer é negociar, ao mesmo tempo que se esquiva das críticas em casa. A análise é de Immanuel Wallerstein.
Immanuel Wallerstein - Esquerda.Net
Durante as últimas semanas, a atenção mundial esteve concentrada no Irã, onde houve um enorme conflito sobre as contestadas eleições presidenciais. Parece agora bastante claro que Mahmoud Ahmadinejad tomará posse como o próximo presidente do Irão com o pleno apoio do ayatollah Ali Khamenei. O presidente Barack Obama tem sofrido pressões consideráveis, principalmente das forças conservadoras dentro dos Estados Unidos, para assumir uma posição "mais dura" sobre as eleições iranianas. Ao mesmo tempo, ao que parece, ele tem recebido conselhos opostos de Pequim. M.K. Bhadrakumar (1) disse que Pequim alertou para a possibilidade de "deixar o génio da mobilização popular sair da garrafa, numa região altamente volátil que está à espera de explodir." O mau exemplo de Pequim é a Tailândia, um país que não é dos mais importantes para a maioria dos comentadores e políticos americanos. Seja como for, não é de todo claro o que quer dizer assumir uma posição "mais dura", mas parece evidente que Obama foi cauteloso nas suas declarações públicas. Vejam o que tem ocorrido neste mesmo período. Em 24 de Julho, a Casa Branca anunciou que se prepara para reenviar um embaixador para a Síria, desfazendo uma decisão de há quatro anos do presidente Bush. E, em 25 de Junho, o presidente Hugo Chávez da Venezuela anunciou que o seu país e os Estados Unidos vão reenviar os seus embaixadores, os mesmo que tinham sido declarados persona non grata nos últimos dias da administração Bush. Há quem se pergunte o que sentiu Obama quando leu as transcrições das gravações do presidente Nixon, que foram tornadas públicas a 23 de Junho. Entre outras coisas, estas fitas revelam uma conversa que Nixon teve com o secretário de Estado Henry Kissinger em 20 de Janeiro de 1973, sobre um acordo que os Estados Unidos estavam à beira de concluir com o governo do Vietnã do Norte. Nixon e Kissinger viam-no como um acordo para salvar a face, que permitiria aos Estados Unidos uma retirada "com honra" da guerra, sabendo que, depois de uma "pausa decente", o acordo resultaria numa vitória militar do Viet Minh. Eles tinham um pequeno problema. Havia resistências ao acordo, por motivos óbvios, do presidente Nguyen Van Thieu, do Vietnã do Sul. A discussão Nixon-Kissinger era sobre como lidar com este problema. Kissinger disse que o problema era se Thieu "vai deixar-nos assinar" o acordo. Nixon disse: "Deixar-nos... ha ha". Nixon prosseguiu dizendo que Kissinger tinha de dizer a Thieu que os EUA "cortariam as verbas de assistência" se ele se recusasse a alinhar. Continuou: "Não sei se a ameaça vai muito longe ou não, mas eu não faria nada... cortaria a cabeça dele, se necessário." A única coisa que Obama sabe é que já não é realmente possível para o presidente dos Estados Unidos cortar a cabeça de ninguém, inimigo ou aliado, que o desafie. Já em Julho de 2007, Obama mostrou compreensão desta nova realidade, quando respondeu a uma entrevista durante a campanha presidencial. A questão era: "Está disposto a encontrar-se separadamente, sem pré-condições, durante o primeiro ano da sua administração, em Washington ou qualquer outro lugar, com os líderes do Irã, Síria, Venezuela, Cuba e Coreia do Norte?" Resposta: "Estou." Foi atacado imediatamente pela sua rival democrata nas primárias, Hillary Clinton, que o acusou de "ingenuidade". Agora é Hillary Clinton, como secretária de Estado de Obama, que está a cumprir o compromisso. A verdade é que Obama não tem muita escolha. Não parece haver formas práticas que lhe permitam "cortar a cabeça" de Ahmadinejad, Chávez, Assad, Castro ou Kim Jong-Il. E não são só estas as cabeças que ele não pode cortar. Não pode afastar o primeiro-ministro de Israel, Nethanyau, do cargo. Também não pode fazer o Hamas desaparecer de Gaza. Sarkozy, Merkel, Putin, e Hu Jintao parecem todos bastante seguros nas suas posições. A verdade é que Obama vai em breve descobrir, se não o fez já, que não há muito que possa fazer em relação ao primeiro-ministro Nouri al-Maliki do Iraque, apesar de ser provável que al-Maliki se distancie cada vez mais da política dos EUA. Que pode então um pobre presidente fazer? Refugiar-se na famosa citação do presidente John F. Kennedy, uma citação que Obama fez mais que uma vez: "Não devemos nunca negociar por medo, mas nunca devemos ter medo de negociar." Isto não quer dizer que o presidente dos Estados Unidos seja impotente. Significa apenas que o melhor que pode fazer é negociar, ao mesmo tempo que se esquiva das críticas em casa. No fundo, Obama partilha a preocupação de Pequim - não deixar o gênio da mobilização popular sair da garrafa, porque o mundo de hoje é altamente "volátil" - e nenhum governo pode estar seguro do que vai acontecer. Governos, de todos os gêneros, podem fazer concessões a mobilizações populares. Mas governos, de todos os gêneros, não estão realmente dispostos a submeter as suas políticas e o seu poder às reivindicações populares. Tradução de Luis Leiria (Esquerda.net)(1) M K Bhadrakumar: diplomata de carreira do ministério dos Negócios Estrangeiros da Índia por mais de 29 anos, com cargos como embaixador no Uzbequistão (1995-98) e na Turquia (1998-2001). Atualmente escreve em diversos jornais.
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Obama tem sofrido pressões consideráveis, principalmente das forças conservadoras dentro dos Estados Unidos, para assumir uma posição "mais dura" sobre as eleições iranianas e em outros temas. O que pode um presidente fazer? Refugiar-se na famosa citação de John F. Kennedy, uma citação que Obama fez mais que uma vez: "Não devemos nunca negociar por medo, mas nunca devemos ter medo de negociar." Isto não quer dizer que o presidente dos EUA seja impotente. Significa apenas que o melhor que pode fazer é negociar, ao mesmo tempo que se esquiva das críticas em casa. A análise é de Immanuel Wallerstein.
Immanuel Wallerstein - Esquerda.Net
Durante as últimas semanas, a atenção mundial esteve concentrada no Irã, onde houve um enorme conflito sobre as contestadas eleições presidenciais. Parece agora bastante claro que Mahmoud Ahmadinejad tomará posse como o próximo presidente do Irão com o pleno apoio do ayatollah Ali Khamenei. O presidente Barack Obama tem sofrido pressões consideráveis, principalmente das forças conservadoras dentro dos Estados Unidos, para assumir uma posição "mais dura" sobre as eleições iranianas. Ao mesmo tempo, ao que parece, ele tem recebido conselhos opostos de Pequim. M.K. Bhadrakumar (1) disse que Pequim alertou para a possibilidade de "deixar o génio da mobilização popular sair da garrafa, numa região altamente volátil que está à espera de explodir." O mau exemplo de Pequim é a Tailândia, um país que não é dos mais importantes para a maioria dos comentadores e políticos americanos. Seja como for, não é de todo claro o que quer dizer assumir uma posição "mais dura", mas parece evidente que Obama foi cauteloso nas suas declarações públicas. Vejam o que tem ocorrido neste mesmo período. Em 24 de Julho, a Casa Branca anunciou que se prepara para reenviar um embaixador para a Síria, desfazendo uma decisão de há quatro anos do presidente Bush. E, em 25 de Junho, o presidente Hugo Chávez da Venezuela anunciou que o seu país e os Estados Unidos vão reenviar os seus embaixadores, os mesmo que tinham sido declarados persona non grata nos últimos dias da administração Bush. Há quem se pergunte o que sentiu Obama quando leu as transcrições das gravações do presidente Nixon, que foram tornadas públicas a 23 de Junho. Entre outras coisas, estas fitas revelam uma conversa que Nixon teve com o secretário de Estado Henry Kissinger em 20 de Janeiro de 1973, sobre um acordo que os Estados Unidos estavam à beira de concluir com o governo do Vietnã do Norte. Nixon e Kissinger viam-no como um acordo para salvar a face, que permitiria aos Estados Unidos uma retirada "com honra" da guerra, sabendo que, depois de uma "pausa decente", o acordo resultaria numa vitória militar do Viet Minh. Eles tinham um pequeno problema. Havia resistências ao acordo, por motivos óbvios, do presidente Nguyen Van Thieu, do Vietnã do Sul. A discussão Nixon-Kissinger era sobre como lidar com este problema. Kissinger disse que o problema era se Thieu "vai deixar-nos assinar" o acordo. Nixon disse: "Deixar-nos... ha ha". Nixon prosseguiu dizendo que Kissinger tinha de dizer a Thieu que os EUA "cortariam as verbas de assistência" se ele se recusasse a alinhar. Continuou: "Não sei se a ameaça vai muito longe ou não, mas eu não faria nada... cortaria a cabeça dele, se necessário." A única coisa que Obama sabe é que já não é realmente possível para o presidente dos Estados Unidos cortar a cabeça de ninguém, inimigo ou aliado, que o desafie. Já em Julho de 2007, Obama mostrou compreensão desta nova realidade, quando respondeu a uma entrevista durante a campanha presidencial. A questão era: "Está disposto a encontrar-se separadamente, sem pré-condições, durante o primeiro ano da sua administração, em Washington ou qualquer outro lugar, com os líderes do Irã, Síria, Venezuela, Cuba e Coreia do Norte?" Resposta: "Estou." Foi atacado imediatamente pela sua rival democrata nas primárias, Hillary Clinton, que o acusou de "ingenuidade". Agora é Hillary Clinton, como secretária de Estado de Obama, que está a cumprir o compromisso. A verdade é que Obama não tem muita escolha. Não parece haver formas práticas que lhe permitam "cortar a cabeça" de Ahmadinejad, Chávez, Assad, Castro ou Kim Jong-Il. E não são só estas as cabeças que ele não pode cortar. Não pode afastar o primeiro-ministro de Israel, Nethanyau, do cargo. Também não pode fazer o Hamas desaparecer de Gaza. Sarkozy, Merkel, Putin, e Hu Jintao parecem todos bastante seguros nas suas posições. A verdade é que Obama vai em breve descobrir, se não o fez já, que não há muito que possa fazer em relação ao primeiro-ministro Nouri al-Maliki do Iraque, apesar de ser provável que al-Maliki se distancie cada vez mais da política dos EUA. Que pode então um pobre presidente fazer? Refugiar-se na famosa citação do presidente John F. Kennedy, uma citação que Obama fez mais que uma vez: "Não devemos nunca negociar por medo, mas nunca devemos ter medo de negociar." Isto não quer dizer que o presidente dos Estados Unidos seja impotente. Significa apenas que o melhor que pode fazer é negociar, ao mesmo tempo que se esquiva das críticas em casa. No fundo, Obama partilha a preocupação de Pequim - não deixar o gênio da mobilização popular sair da garrafa, porque o mundo de hoje é altamente "volátil" - e nenhum governo pode estar seguro do que vai acontecer. Governos, de todos os gêneros, podem fazer concessões a mobilizações populares. Mas governos, de todos os gêneros, não estão realmente dispostos a submeter as suas políticas e o seu poder às reivindicações populares. Tradução de Luis Leiria (Esquerda.net)(1) M K Bhadrakumar: diplomata de carreira do ministério dos Negócios Estrangeiros da Índia por mais de 29 anos, com cargos como embaixador no Uzbequistão (1995-98) e na Turquia (1998-2001). Atualmente escreve em diversos jornais.
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A Folha quer o fim da TV Brasil
A Folha quer o fim da TV Brasil
Em editorial, a Folha de São Paulo defende o fechamento da TV Brasil para "não desperdiçar o dinheiro do contribuinte". O jornal da família Frias não vê, por outro lado, nenhum problema na existência de um oligopólio privado na televisão aberta. É como se fosse natural que apenas 6 empresas tivessem o direito de se comunicar via tv com 191 milhões de pessoas. O artigo é de Marcelo Salles.
Marcelo Salles (*)
A Folha quer o fim da TV Brasil. Em editorial publicado hoje argumenta que a audiência é baixa, que sua criação não foi um ato democrático (porque nasceu de um decreto) e que gasta, por ano, 350 milhões de reais do dinheiro do contribuinte. Por isso, encerra o texto da seguinte forma: “Os vícios de origem e o retumbante fracasso de audiência recomendam que a TV seja fechada – antes que se desperdice mais dinheiro do contribuinte” (veja a íntegra abaixo).Eu tenho críticas à TV Brasil, mas nenhuma delas tem a ver com a opinião da Folha. Aliás, seria bom a gente perguntar: a quem serve a Folha? No cabeçalho se diz que é um jornal a serviço do Brasil, o que soa como piada pra quem conhece minimamente a história da imprensa do país. Pra não ir muito longe, basta dizer que o jornalão emprestou veículos para a ditadura. Mas talvez isso seja uma questão de ponto de vista: estavam, diria o jornal da “ditabranda”, a serviço do Brasil contra a Comunidade Comunista, que pretendia se instalar no governo federal.Voltando. A TV Brasil é uma tentativa de cumprir a Constituição, que determina a complementariedade entre os serviços privado, público e estatal. Hoje só existe o privado e, tenho certeza, isto tem a ver com o lixo jogado no ar todos os dias. Sim, amigos, a televisão privada brasileira é um lixo. Não presta. Raríssimos são os programas razoáveis. Na Globo, por exemplo, nada menos que metade da programação entre 12h e 24h é de novela. E de uma novela que dissemina os piores valores morais que existem.Posso concordar que existem erros graves na TV Brasil, e o primeiro deles foi a entrega dos cargos de direção para jornalistas oriundos das corporações de mídia. Com isso o governo indicou uma conciliação, não uma mudança substancial no jeito de fazer jornalismo. Assim, não é à toa que muito do conteúdo veiculado pela TV Brasil, sobretudo nos telejornais, tem sido muito parecido com aquele das corporações privadas (ver a carta do Mário Augusto Jakobskind à Ouvidoria da emissora).Por outro lado, não dá pra dizer que é tudo igual. Se pegarmos a programação como um todo, veremos a existência de iniciativas que jamais teriam vez no atual sistema privado de televisão. É o caso dos documentários, que dão voz e vez aos segmentos da sociedade que só aparecem na mídia corporativa como bandidos.Por isso, o governo precisa se manter firme diante da pressão da Folha. E contra-atacar. Pra começar, coloque em pauta a mudança na lei que criminaliza as rádios comunitárias e determine que sua Polícia Federal vá se preocupar com aqueles que realmente ameaçam a sociedade. Essa babaquice de inimigo interno já fez muito mal ao país. Enquanto calam as vozes do povo, armas e drogas atravessam nossas fronteiras numa boa. O Rio está infestado delas, e boa parte da culpa é da falta de fiscalização.No Brasil arcaico do século XXI, as emissoras privadas de televisão, todas golpistas, ainda recebem dinheiro grosso do governo (meu, seu, nosso) para veicular campanhas publicitárias de saúde pública. Em países um pouquinho mais civilizados isso não é assim, pois como as emissoras privadas são concessões públicas (decididas pelo meu, seu, nossos representantes no Congresso), trata-se de uma obrigação ceder espaço para veiculação de mensagens de interesse público, sobretudo em relação a epidemias (como, atualmente, a gripe suína). Isso a Folha não critica.Assim como não vê problemas na existência de um oligopólio privado na televisão aberta. Justo o jornal que faz propaganda dizendo-se democrata (”quem lê a Folha fortalece a democracia”). Deveria ser processado por propaganda enganosa. A Folha não se incomoda com a SS brasileira, a Sociedade Sinistra que congrega TV Globo, RedeTV, Band, CNT, SBT e Record. É como se fosse natural que apenas 6 empresas tivessem o direito de se comunicar via tv com 191 milhões de pessoas. E, pior, é como se fosse natural que esse oligopólio se posicionasse, compacto, pela economia de mercado, pela cultura enlatada, pela política coronelista (Sarney foi “descoberto” com 30 anos de atraso), pelo imperialismo e pela exploração das riquezas e do povo brasileiro. É isso que veiculam, todos os dias, e, se discordam, desafio qualquer diretor de qualquer uma dessas empresas para um debate público, de preferência veiculado em cadeia nacional de rádio e televisão.Eis a dupla desgraça brasileira. Um sistema de comunicação apátrida, a serviço do capitalismo internacional, e um governo – eleito pelo povo e pelos movimentos sociais organizados – que não se livra disso.Marcelo Salles, jornalista, é coordenador da Caros Amigos no Rio de Janeiro e editor do Fazendo Media.Editorial da Folha de S. Paulo, 31 de julho de 2009:TV que não pega LANÇADA EM 2007 pelo governo como se fosse uma espécie de versão brasileira da BBC, a TV Brasil já perdeu 6 dos seus 15 conselheiros originais em pouco mais de um ano e meio. Coincidentemente, a TV criada por Lula acabou de ganhar uma nova identidade visual, que, segundo comunicado da emissora, dará “uma cara moderna e atual” ao logotipo. Mas pouca gente ficou sabendo, dado o exíguo alcance do canal.A TV Brasil integra a EBC (Empresa Brasil de Comunicação), que tem Orçamento de R$ 350 milhões por ano e abarca nove rádios e duas outras emissoras, além de seu carro-chefe.O governo queria, com a EBC, criar uma grande rede pública nacional. Após a saída de três diretores vinculados ao Ministério da Cultura, o controle ficou nas mãos da Secretaria de Comunicação, do ministro Franklin Martins. A TV que se queria pública é antes de mais nada um cabide de empregos.O lance mais recente da novela da emissora foi o anúncio feito à Folh a pelo presidente do conselho curador, Luiz Gonzaga Belluzzo, de que entregará o cargo.Antes dos problemas políticos, a empresa padece de irrelevância técnica. Tem alcance muito restrito pela rede aberta, funcionando basicamente para clientes de operadoras de TV por assinatura. Segundo a emissora, muitos espectadores assistem à programação por antena parabólica, o que também serve como justificativa para não divulgar dados sobre audiência.O fato é que a TV Brasil já começou mal, através de uma medida provisória, em vez do encaminhamento por projeto de lei. Tem 15 “representantes da sociedade civil” em seu conselho, todos nomeados pelo presidente Lula. Os vícios de origem e o retumbante fracasso de audiência recomendam que a TV seja fechada -antes que se desperdice mais dinheiro do contribuinte.
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16102
Em editorial, a Folha de São Paulo defende o fechamento da TV Brasil para "não desperdiçar o dinheiro do contribuinte". O jornal da família Frias não vê, por outro lado, nenhum problema na existência de um oligopólio privado na televisão aberta. É como se fosse natural que apenas 6 empresas tivessem o direito de se comunicar via tv com 191 milhões de pessoas. O artigo é de Marcelo Salles.
Marcelo Salles (*)
A Folha quer o fim da TV Brasil. Em editorial publicado hoje argumenta que a audiência é baixa, que sua criação não foi um ato democrático (porque nasceu de um decreto) e que gasta, por ano, 350 milhões de reais do dinheiro do contribuinte. Por isso, encerra o texto da seguinte forma: “Os vícios de origem e o retumbante fracasso de audiência recomendam que a TV seja fechada – antes que se desperdice mais dinheiro do contribuinte” (veja a íntegra abaixo).Eu tenho críticas à TV Brasil, mas nenhuma delas tem a ver com a opinião da Folha. Aliás, seria bom a gente perguntar: a quem serve a Folha? No cabeçalho se diz que é um jornal a serviço do Brasil, o que soa como piada pra quem conhece minimamente a história da imprensa do país. Pra não ir muito longe, basta dizer que o jornalão emprestou veículos para a ditadura. Mas talvez isso seja uma questão de ponto de vista: estavam, diria o jornal da “ditabranda”, a serviço do Brasil contra a Comunidade Comunista, que pretendia se instalar no governo federal.Voltando. A TV Brasil é uma tentativa de cumprir a Constituição, que determina a complementariedade entre os serviços privado, público e estatal. Hoje só existe o privado e, tenho certeza, isto tem a ver com o lixo jogado no ar todos os dias. Sim, amigos, a televisão privada brasileira é um lixo. Não presta. Raríssimos são os programas razoáveis. Na Globo, por exemplo, nada menos que metade da programação entre 12h e 24h é de novela. E de uma novela que dissemina os piores valores morais que existem.Posso concordar que existem erros graves na TV Brasil, e o primeiro deles foi a entrega dos cargos de direção para jornalistas oriundos das corporações de mídia. Com isso o governo indicou uma conciliação, não uma mudança substancial no jeito de fazer jornalismo. Assim, não é à toa que muito do conteúdo veiculado pela TV Brasil, sobretudo nos telejornais, tem sido muito parecido com aquele das corporações privadas (ver a carta do Mário Augusto Jakobskind à Ouvidoria da emissora).Por outro lado, não dá pra dizer que é tudo igual. Se pegarmos a programação como um todo, veremos a existência de iniciativas que jamais teriam vez no atual sistema privado de televisão. É o caso dos documentários, que dão voz e vez aos segmentos da sociedade que só aparecem na mídia corporativa como bandidos.Por isso, o governo precisa se manter firme diante da pressão da Folha. E contra-atacar. Pra começar, coloque em pauta a mudança na lei que criminaliza as rádios comunitárias e determine que sua Polícia Federal vá se preocupar com aqueles que realmente ameaçam a sociedade. Essa babaquice de inimigo interno já fez muito mal ao país. Enquanto calam as vozes do povo, armas e drogas atravessam nossas fronteiras numa boa. O Rio está infestado delas, e boa parte da culpa é da falta de fiscalização.No Brasil arcaico do século XXI, as emissoras privadas de televisão, todas golpistas, ainda recebem dinheiro grosso do governo (meu, seu, nosso) para veicular campanhas publicitárias de saúde pública. Em países um pouquinho mais civilizados isso não é assim, pois como as emissoras privadas são concessões públicas (decididas pelo meu, seu, nossos representantes no Congresso), trata-se de uma obrigação ceder espaço para veiculação de mensagens de interesse público, sobretudo em relação a epidemias (como, atualmente, a gripe suína). Isso a Folha não critica.Assim como não vê problemas na existência de um oligopólio privado na televisão aberta. Justo o jornal que faz propaganda dizendo-se democrata (”quem lê a Folha fortalece a democracia”). Deveria ser processado por propaganda enganosa. A Folha não se incomoda com a SS brasileira, a Sociedade Sinistra que congrega TV Globo, RedeTV, Band, CNT, SBT e Record. É como se fosse natural que apenas 6 empresas tivessem o direito de se comunicar via tv com 191 milhões de pessoas. E, pior, é como se fosse natural que esse oligopólio se posicionasse, compacto, pela economia de mercado, pela cultura enlatada, pela política coronelista (Sarney foi “descoberto” com 30 anos de atraso), pelo imperialismo e pela exploração das riquezas e do povo brasileiro. É isso que veiculam, todos os dias, e, se discordam, desafio qualquer diretor de qualquer uma dessas empresas para um debate público, de preferência veiculado em cadeia nacional de rádio e televisão.Eis a dupla desgraça brasileira. Um sistema de comunicação apátrida, a serviço do capitalismo internacional, e um governo – eleito pelo povo e pelos movimentos sociais organizados – que não se livra disso.Marcelo Salles, jornalista, é coordenador da Caros Amigos no Rio de Janeiro e editor do Fazendo Media.Editorial da Folha de S. Paulo, 31 de julho de 2009:TV que não pega LANÇADA EM 2007 pelo governo como se fosse uma espécie de versão brasileira da BBC, a TV Brasil já perdeu 6 dos seus 15 conselheiros originais em pouco mais de um ano e meio. Coincidentemente, a TV criada por Lula acabou de ganhar uma nova identidade visual, que, segundo comunicado da emissora, dará “uma cara moderna e atual” ao logotipo. Mas pouca gente ficou sabendo, dado o exíguo alcance do canal.A TV Brasil integra a EBC (Empresa Brasil de Comunicação), que tem Orçamento de R$ 350 milhões por ano e abarca nove rádios e duas outras emissoras, além de seu carro-chefe.O governo queria, com a EBC, criar uma grande rede pública nacional. Após a saída de três diretores vinculados ao Ministério da Cultura, o controle ficou nas mãos da Secretaria de Comunicação, do ministro Franklin Martins. A TV que se queria pública é antes de mais nada um cabide de empregos.O lance mais recente da novela da emissora foi o anúncio feito à Folh a pelo presidente do conselho curador, Luiz Gonzaga Belluzzo, de que entregará o cargo.Antes dos problemas políticos, a empresa padece de irrelevância técnica. Tem alcance muito restrito pela rede aberta, funcionando basicamente para clientes de operadoras de TV por assinatura. Segundo a emissora, muitos espectadores assistem à programação por antena parabólica, o que também serve como justificativa para não divulgar dados sobre audiência.O fato é que a TV Brasil já começou mal, através de uma medida provisória, em vez do encaminhamento por projeto de lei. Tem 15 “representantes da sociedade civil” em seu conselho, todos nomeados pelo presidente Lula. Os vícios de origem e o retumbante fracasso de audiência recomendam que a TV seja fechada -antes que se desperdice mais dinheiro do contribuinte.
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TV Brasil sinaliza nova etapa da comunicação pública
TV Brasil sinaliza nova etapa da comunicação pública
A TV Brasil, que já oferece aos brasileiros uma programação não capturada pela publicidade cervejeira e medicamentosa, que exibe apenas publicidade de valores cidadãos e humanizados, que já recupera em grande medida parte substancial do nosso audiovisual, além das conquistas civilizatórias de sua grade de programação, agora dá um passo à frente, criando a novidade democrática de discutir com a sociedade como se deve fazer televisão. O artigo é de Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília.
Beto Almeida (*)
Com a presença de 3 ministros de estados ( Franklin Martins, Juca Ferreira e Sérgio Rezende) e transmitida ao vivo pelo canal NBR, a primeira audiência pública da TV Brasil inaugura uma nova etapa para a tv brasileira, dando continuidade a várias mudanças que o governo Lula tem realizado no sentido do fortalecimento da comunicação pública no Brasil. Esta audiência tem o simbolismo de se inscrever no processo de recuperação dos espaços públicos midiáticos, processo que ocorre também em vários países da América Latina, com o surgimento de emissoras públicas e estatais, com o nascimento de jornais públicos e de acesso popular como “Cambio” , na Bolívia, e o “Correo del Orinoco”, na Venezuela, e com políticas de estado que permitem concretamente que os povos já tenham alternativas ao jornalismo consumista e de manipulação informativa sob o controle dos conglomerados privados.Aqui no Brasil, com esta primeira audiência pública, onde o diálogo de ministros e público foi televisionado na íntegra, sem edições, a Empresa Brasil de Comunicação EBC, criada pelo governo Lula , marcou um golaço em termos de democracia participativa. Além desnudar toda a tagarelice acerca de interatividade alardeada pelas emissoras privadas, que jamais realizaram nem planejam realizar uma audiência pública - mesmo sendo detentoras de concessões públicas para uso do espaço rádio-elétrico que pertence à União. Na tv comercial, a democracia começa e termina no Departamento Comercial, no preço do anúncio, no jabaculê, no controle do mercado cartelizado sobre a programação, ditando seu vale-tudo rebaixador dos conteúdos cada vez mais animalizados.A TV Brasil, que já oferece aos brasileiros uma programação não capturada pela publicidade cervejeira e medicamentosa, que exibe apenas publicidade de valores cidadãos e humanizados, que já recupera em grande medida parte substancial do nosso audiovisual que luta para sair da clandestinidade, agravada após a demolição da Embrafilme, além das conquistas civilizatórias de sua grade de programação, agora dá um passo à frente, criando a novidade democrática de discutir com a sociedade como se deve fazer televisão. Só uma empresa no campo do poder público pode fazer isto, colocando ministros de estado, seu Conselho Curador, seus diretores e parte de seus funcionários diante do público e de para ouvir críticas e propostas de superação e de consolidação do que já está sinalizado desde que Lula decidiu montar a TV Brasil cumprindo com o seu programa de campanha de 2002: a criação de uma TV pública constava do documento-compromisso “A imaginação a serviço do Brasil”, assumido pelo presidente.Audiência convoca para fazer tv de novo modoClaro que uma novidade democrática como uma audiência pública para debater como fazer televisão é também uma oportunidade tão singular que revela também desconcerto por parte do público participante, confundindo prioridades. Tal como declarou o Ministro Franklin Martins, muito tempo da audiência foi dedicado ao debate de conceitos, quando o fundamental, que estava diante de todos e da sociedade que assistia pela TV era uma preciosa oportunidade para a apresentação de idéias e propostas sobre como fazer uma nova televisão. A missão pública da TV Brasil já vem sendo crescentemente revelada, construída e comprovada em parte pela sua própria programação. Primeiro, ao mostrar o Brasil por inteiro, todas as suas regiões e manifestações sociais e culturais, sem praticar a desigualdade regional-informativa, buscando o cumprimento da Constituição. Também ao mostrar a América Latina e a África, sobretudo por exibir documentários como, por exemplo, a luta do povo de Angola, com ajuda de Cuba para derrotar o exército racista na Batalha de Cuito Cuanavale, que, para Mandela, significou “o começo do fim apartheid”. Jamais documentários como este foram exibidos na tv brasileira em toda sua existência.Muitos dos conceitos debatidos a longa data pelos movimentos de democratização da comunicação e também na academia já se transformaram em realidade, em fatos, em nova programação televisiva, muito embora haja muito por ser superado, sobretudo no campo do jornalismo ainda convencional praticado pela TV Brasil. No entanto, não foi este o tema mais debatido, quando na discussão conceitual a própria universidade brasileira e seus laboratórios de comunicação continuam em dívida com a sociedade brasileira já que, embora há décadas debatam e debatam um modelo de tv pública, ainda não chegaram a qualquer proposta objetiva. Lula tinha uma: a TV Brasil, que estava no Seminário de Comunicação e Cultura do PT, realizado em 2002. Enquanto estamos com uma tv no ar, saldando parcialmente a dívida informativo-cultural contra o povo, realizando mudanças, avançando em novidades democráticas, como a realização de audiências públicas democráticas, razoavelmente acessíveis e televisionadas, há quem ainda insista num debate predominantemente acadêmico.A oportunidade foi criada, mas talvez pudesse ter sido ainda mais plenamente bem aproveitada, exatamente porque trata-se de uma novidade democrática. Vale lembrar que boa parte das reivindicações dos diferentes movimentos que constituem a luta pela democratização da comunicação já são atendidas pela própria programação da TV Brasil. Não há propaganda violentando direitos das crianças, não se cultua o álcool, nem se iconiza a velocidade ou o consumismo de guloseimas quando diabetes, obesidade e doenças cardíacas assumem estatísticas epidêmicas. Há documentários de importância histórica e política imensa, filmes nacionais finalmente democratizados e tirados do ostracismo.Jornalismo da integraçãoNo entanto, o jornalismo da TV Brasil continua desafiado a apresentar mudança de conceitos, não de apenas de formatos como argumentou-se durante a audiência. Para exemplificar, há uma mudança política importantíssima no cenário latino-americano, com muitos países recuperando a soberania sobre suas próprias riquezas nacionais, escapando dos controles imperialistas sobre as práticas comerciais impositivas, alterando a composição e as políticas de organismos de sombria trajetória como a OEA. E há, sobretudo, um conjunto de iniciativas para a integração regional, inclusive, em muitos casos, com a dispensa de operações em dólar, como entre Brasil e Argentina. Que diante deste conjunto expressivo de mudanças a mídia comercial continue a dizer que a criação da Unasul, do Banco do Sul, da Unila, etc é apenas retórica itamarateca, passando informações manipuladas e descontextualizadas para afirmar que há fracasso nestas políticas, não há nenhuma surpresa pois está praticando o seu jornalismo de desintegração, em sintonia com o objetivos das transnacionais que querem a América Latina desunida, confrontada, para melhor rapiná-la. Mas, que o jornalismo da TV Brasil não seja capaz de apresentar uma nova concepção de notícia diante desta riqueza de experiências transformadoras, é um contra-senso com a novidade que a própria TV Brasil encarna, e um conservadorismo que leva a que a sociedade brasileira não tenha informação alternativa para perceber o que já ocorre concretamente com, por exemplo, o verdadeiro Mercosul Social em curso, medidas de cooperação e integração entre municípios de fronteira, na esfera de políticas. Tudo isto sonegado.Alguns exemplos ainda não explorados pelo jornalismo da TV Brasil frente ao jornalismo da desintegração: lançada a campanha midiática contra a adesão da Venezuela ao Mercosul, o jornalismo da integração, sintonizado com nossa Constituição, poderia mostrar a importância da integração energética entre Brasil e Venezuela, pela qual Roraima já é abastecida pela Hidroelétrica venezuelana de Guri, quando antes era iluminada por poluentes e caras termoelétricas a diesel. Eis aí o único “perigo” da cooperação com a Venezuela: mais progresso social, menos dependência de petróleo, menos poluição etc. Outra possibilidade de exploração pelo jornalismo da TV Brasil, se adotasse outra concepção de notícia: quanto já foi economizado com o início das operações bilaterais entre Brasil e Argentina sem a presença da moeda inconfiável do dólar, ademais, emitida sem lastro? Quanto se pode explorar jornalisticamente deste fato, inclusive do ponto de vista simbólico, localizado nesta soberana dispensa ao dólar?Honduras, TV e solidariedade Ainda partindo do cenário da integração promovida por vários governos, a própria cobertura sobre o golpe em Honduras poderia ter sido muito superior a partir da simples cooperação com Telesur que transmitiu ao vivo praticamente todos os dias do golpe, da resistência e também da gigantesca manifestação que esperava a chegada do presidente Manoel Zelaya. A TV Cidade Livre de Brasília retransmitiu o sinal de Telesur e recebeu inúmeras manifestações informais de reconhecimento, especialmente de membros do governo, dada a relevância o fato televisionado. Não poderia tudo isto ter sido feito pela TV Brasil? O que impediu? Recursos técnicos? Não, apenas a necessidade de se adotar novos conceitos para o jornalismo, conceitos que podem ser colocados em prática imediatamente, o que não seria possível numa tv privada onde o jornalismo depende do departamento comercial. No caso da TV Brasil, o patrocinador é o povo brasileiro e a linha mestra editorial é a Constituição Brasileira, que compromete-se com a integração latino-americana. E esta integração tem que ser também informativa e cultural. E teria sido a solidariedade política do povo e do governo brasileiro para com o povo de Honduras, pois, dado o seu simbolismo para o momento, todos os povos fomos alvos do golpe de estado hondurenho.A criação da Sociedade dos Amigos da TV BrasilDentre as várias propostas apresentadas na Audiência uma destina-se a agregar participação do público para um diálogo propositivo e organizado da TV Brasil com o telespectador. Trata-se da idéia da criação de uma Sociedade Brasileira dos Amigos da TV Brasil, com capacidade tanto de estimular por parte do público a qualificação de sua leitura crítica televisiva, criando mais canais pelos quais (além da Ouvidoria que só a EBC possui) os impactos da programação em diferentes partes do país sejam captados, comunicados, refletidos de modo organizado e regular, fazendo com que se desenvolva por meio de uma emulação e fruição de opiniões e propostas, uma noção de pertencimento e co-responsabilidade do público em relação à emissora pública.Esta Sociedade estimularia a participação crítica dos telespectadores - idéia rigorosamente desprezada e vetada na tv comercial - na linha de uma cidadania televisiva. Diante da baixaria televisiva privada, devemos zelar, consolidar e qualificar a tv que nos pertence diretamente, assumindo como coletivo, e não apenas pelos seus dirigentes, o desafio de uma televisão cada vez mais humanizadora, um contribuição brasileira para a tv mundial. Mas que também seja capaz de disputar audiência, sem ilusões com o diletantismo da tese que defende indiferença diante do número de telespectadores sintonizados . Em se tratando de política pública de comunicação e de televisão em particular, será temerário cultivar a idéia de que devemos ser indiferentes se milhões de brasileiros seguem capturados por uma programação embrutecedora da tv comercial que reforça práticas anti-cidadãs, anti-democráticas na sociedade. Deve-se colocar como problema de todos, coletivo, que a TV Brasil tem o direito de pretender ter audiência e que para isto deva também ter uma programação de entretenimento sadio e inteligente, até mesmo aceitando o desafio de produzir, quando possível, teledramaturgias culturalmente elevadas, sobretudo para oferecer ao povo a chance de conhecer em profundidade a vida de personagens relevantes de nossa história tais como Santos Dumont, Euclides da Cunha, Villa-Lobos, no bem sucedido formato de telenovelas. Como desdobramento, é importante levantar o debate sobre o legítimo direito da TV Brasil em não se submeter às várias formas de reservas de mercado impostas pela TV comercial, com o concurso de recursos públicos. A TV Brasil pode e deve pretender ter uma programação de futebol e demais esportes de massa, de Carnaval e demais festas populares (como já começa a experimentar com sucesso o São João Nordestino) e também não se sujeitar à verdadeira reserva de mercado informal existente para a telenovela. Tal como disse o presidente do Conselho Curador da EBC, Luiz Gonzaga Beluzzo: a TV Brasil também deveria poder transmitir o Campeonato Brasileiro, o que no fundo indica que há uma legítima resistência que precisa ser organizada contra a tendência de privatização da transmissão de futebol pela filosofia da tv paga, dificultando cada vez mais que os brasileiros tenham acesso a umas de suas grandes paixões. Absurdo: quanto mais tecnologia televisiva, menos acesso para a grande maioria à totalidade dos jogos!Leitura crítica da comunicaçãoExiste um clamor difuso na sociedade brasileira contra a programação degradante das tvs comerciais, mas há evidentemente um captura de sua audiência ainda em razão da não existência de alternativas na TV Pública com a força, a decisão e a qualificação para fazer plenamente e “pra valer” uma disputa de audiência. Um componente deste intrincado problema é a inexistência de uma prática de leitura crítica da televisão - mesmo estando nas emissoras da EBC as raras oportunidades para que isto se realize, nos programas da Ouvidoria e no Ver TV - e é isto também que poderia ser estimulado com a criação da Sociedade dos Amigos da TV Brasil, com debates bem organizados, com a publicação de textos, com a realização de encontros, inclusive com multi-auditórios e com transmissão simultânea. Trata-se de investir em democracia televisiva. Não devemos deixar passar esta oportunidade preciosa como antes ocorreu, quando em 2004 o Presidente Lula criou a RTVI (Rede de TVs Institucionais) tendo sido combatido oficialmente tanto pela Abert como pela Fenaj. Sem apoio, desistiu da iniciativa, até porque o governo vivia outras dificuldades e o tema comunicação só foi retomado mais tarde com a criação da EBC e da TV Brasil. Esta linha de fortalecimento da comunicação pública, da qual fazem parte a nova política de democratização dos anúncios públicos, a criação do Blog da Petrobrás e até mesmo presença de Lula diretamente no jornalismo com sua coluna “O presidente responde”, é indicadora de condições para novos passos à frente, sobretudo para um formato mais democrático da tv digital, assegurando de fato pluralidade, diversidade, regionalização e humanização. Este é um tema para a Conferência Nacional de Comunicação, que também é uma novidade democrática, tirando o tema da penumbra dos tabus e tornando-o agenda do governo e da sociedade.Com sua primeira audiência a TV Brasil dá um passo bem significativo no rumo de conquistar novos modos de fazer e de ver tv, tanto para se perceber os limites a corrigir e superar, mas sobretudo por ser esta novidade democrática de imensa significação política para o fortalecimento das políticas públicas. A audiência também funciona como uma espécie de convocação à sociedade para o desenvolvimento e até mesmo para a invenção de novos instrumentos capazes de sustentar, dialogar, questionar e consolidar a TV Brasil e o seu modo de fazer televisão e jornalismo como direito e tarefa de todos.(*) Beto Almeida é presidente da TV Cidade Livre de Brasília.
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A TV Brasil, que já oferece aos brasileiros uma programação não capturada pela publicidade cervejeira e medicamentosa, que exibe apenas publicidade de valores cidadãos e humanizados, que já recupera em grande medida parte substancial do nosso audiovisual, além das conquistas civilizatórias de sua grade de programação, agora dá um passo à frente, criando a novidade democrática de discutir com a sociedade como se deve fazer televisão. O artigo é de Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília.
Beto Almeida (*)
Com a presença de 3 ministros de estados ( Franklin Martins, Juca Ferreira e Sérgio Rezende) e transmitida ao vivo pelo canal NBR, a primeira audiência pública da TV Brasil inaugura uma nova etapa para a tv brasileira, dando continuidade a várias mudanças que o governo Lula tem realizado no sentido do fortalecimento da comunicação pública no Brasil. Esta audiência tem o simbolismo de se inscrever no processo de recuperação dos espaços públicos midiáticos, processo que ocorre também em vários países da América Latina, com o surgimento de emissoras públicas e estatais, com o nascimento de jornais públicos e de acesso popular como “Cambio” , na Bolívia, e o “Correo del Orinoco”, na Venezuela, e com políticas de estado que permitem concretamente que os povos já tenham alternativas ao jornalismo consumista e de manipulação informativa sob o controle dos conglomerados privados.Aqui no Brasil, com esta primeira audiência pública, onde o diálogo de ministros e público foi televisionado na íntegra, sem edições, a Empresa Brasil de Comunicação EBC, criada pelo governo Lula , marcou um golaço em termos de democracia participativa. Além desnudar toda a tagarelice acerca de interatividade alardeada pelas emissoras privadas, que jamais realizaram nem planejam realizar uma audiência pública - mesmo sendo detentoras de concessões públicas para uso do espaço rádio-elétrico que pertence à União. Na tv comercial, a democracia começa e termina no Departamento Comercial, no preço do anúncio, no jabaculê, no controle do mercado cartelizado sobre a programação, ditando seu vale-tudo rebaixador dos conteúdos cada vez mais animalizados.A TV Brasil, que já oferece aos brasileiros uma programação não capturada pela publicidade cervejeira e medicamentosa, que exibe apenas publicidade de valores cidadãos e humanizados, que já recupera em grande medida parte substancial do nosso audiovisual que luta para sair da clandestinidade, agravada após a demolição da Embrafilme, além das conquistas civilizatórias de sua grade de programação, agora dá um passo à frente, criando a novidade democrática de discutir com a sociedade como se deve fazer televisão. Só uma empresa no campo do poder público pode fazer isto, colocando ministros de estado, seu Conselho Curador, seus diretores e parte de seus funcionários diante do público e de para ouvir críticas e propostas de superação e de consolidação do que já está sinalizado desde que Lula decidiu montar a TV Brasil cumprindo com o seu programa de campanha de 2002: a criação de uma TV pública constava do documento-compromisso “A imaginação a serviço do Brasil”, assumido pelo presidente.Audiência convoca para fazer tv de novo modoClaro que uma novidade democrática como uma audiência pública para debater como fazer televisão é também uma oportunidade tão singular que revela também desconcerto por parte do público participante, confundindo prioridades. Tal como declarou o Ministro Franklin Martins, muito tempo da audiência foi dedicado ao debate de conceitos, quando o fundamental, que estava diante de todos e da sociedade que assistia pela TV era uma preciosa oportunidade para a apresentação de idéias e propostas sobre como fazer uma nova televisão. A missão pública da TV Brasil já vem sendo crescentemente revelada, construída e comprovada em parte pela sua própria programação. Primeiro, ao mostrar o Brasil por inteiro, todas as suas regiões e manifestações sociais e culturais, sem praticar a desigualdade regional-informativa, buscando o cumprimento da Constituição. Também ao mostrar a América Latina e a África, sobretudo por exibir documentários como, por exemplo, a luta do povo de Angola, com ajuda de Cuba para derrotar o exército racista na Batalha de Cuito Cuanavale, que, para Mandela, significou “o começo do fim apartheid”. Jamais documentários como este foram exibidos na tv brasileira em toda sua existência.Muitos dos conceitos debatidos a longa data pelos movimentos de democratização da comunicação e também na academia já se transformaram em realidade, em fatos, em nova programação televisiva, muito embora haja muito por ser superado, sobretudo no campo do jornalismo ainda convencional praticado pela TV Brasil. No entanto, não foi este o tema mais debatido, quando na discussão conceitual a própria universidade brasileira e seus laboratórios de comunicação continuam em dívida com a sociedade brasileira já que, embora há décadas debatam e debatam um modelo de tv pública, ainda não chegaram a qualquer proposta objetiva. Lula tinha uma: a TV Brasil, que estava no Seminário de Comunicação e Cultura do PT, realizado em 2002. Enquanto estamos com uma tv no ar, saldando parcialmente a dívida informativo-cultural contra o povo, realizando mudanças, avançando em novidades democráticas, como a realização de audiências públicas democráticas, razoavelmente acessíveis e televisionadas, há quem ainda insista num debate predominantemente acadêmico.A oportunidade foi criada, mas talvez pudesse ter sido ainda mais plenamente bem aproveitada, exatamente porque trata-se de uma novidade democrática. Vale lembrar que boa parte das reivindicações dos diferentes movimentos que constituem a luta pela democratização da comunicação já são atendidas pela própria programação da TV Brasil. Não há propaganda violentando direitos das crianças, não se cultua o álcool, nem se iconiza a velocidade ou o consumismo de guloseimas quando diabetes, obesidade e doenças cardíacas assumem estatísticas epidêmicas. Há documentários de importância histórica e política imensa, filmes nacionais finalmente democratizados e tirados do ostracismo.Jornalismo da integraçãoNo entanto, o jornalismo da TV Brasil continua desafiado a apresentar mudança de conceitos, não de apenas de formatos como argumentou-se durante a audiência. Para exemplificar, há uma mudança política importantíssima no cenário latino-americano, com muitos países recuperando a soberania sobre suas próprias riquezas nacionais, escapando dos controles imperialistas sobre as práticas comerciais impositivas, alterando a composição e as políticas de organismos de sombria trajetória como a OEA. E há, sobretudo, um conjunto de iniciativas para a integração regional, inclusive, em muitos casos, com a dispensa de operações em dólar, como entre Brasil e Argentina. Que diante deste conjunto expressivo de mudanças a mídia comercial continue a dizer que a criação da Unasul, do Banco do Sul, da Unila, etc é apenas retórica itamarateca, passando informações manipuladas e descontextualizadas para afirmar que há fracasso nestas políticas, não há nenhuma surpresa pois está praticando o seu jornalismo de desintegração, em sintonia com o objetivos das transnacionais que querem a América Latina desunida, confrontada, para melhor rapiná-la. Mas, que o jornalismo da TV Brasil não seja capaz de apresentar uma nova concepção de notícia diante desta riqueza de experiências transformadoras, é um contra-senso com a novidade que a própria TV Brasil encarna, e um conservadorismo que leva a que a sociedade brasileira não tenha informação alternativa para perceber o que já ocorre concretamente com, por exemplo, o verdadeiro Mercosul Social em curso, medidas de cooperação e integração entre municípios de fronteira, na esfera de políticas. Tudo isto sonegado.Alguns exemplos ainda não explorados pelo jornalismo da TV Brasil frente ao jornalismo da desintegração: lançada a campanha midiática contra a adesão da Venezuela ao Mercosul, o jornalismo da integração, sintonizado com nossa Constituição, poderia mostrar a importância da integração energética entre Brasil e Venezuela, pela qual Roraima já é abastecida pela Hidroelétrica venezuelana de Guri, quando antes era iluminada por poluentes e caras termoelétricas a diesel. Eis aí o único “perigo” da cooperação com a Venezuela: mais progresso social, menos dependência de petróleo, menos poluição etc. Outra possibilidade de exploração pelo jornalismo da TV Brasil, se adotasse outra concepção de notícia: quanto já foi economizado com o início das operações bilaterais entre Brasil e Argentina sem a presença da moeda inconfiável do dólar, ademais, emitida sem lastro? Quanto se pode explorar jornalisticamente deste fato, inclusive do ponto de vista simbólico, localizado nesta soberana dispensa ao dólar?Honduras, TV e solidariedade Ainda partindo do cenário da integração promovida por vários governos, a própria cobertura sobre o golpe em Honduras poderia ter sido muito superior a partir da simples cooperação com Telesur que transmitiu ao vivo praticamente todos os dias do golpe, da resistência e também da gigantesca manifestação que esperava a chegada do presidente Manoel Zelaya. A TV Cidade Livre de Brasília retransmitiu o sinal de Telesur e recebeu inúmeras manifestações informais de reconhecimento, especialmente de membros do governo, dada a relevância o fato televisionado. Não poderia tudo isto ter sido feito pela TV Brasil? O que impediu? Recursos técnicos? Não, apenas a necessidade de se adotar novos conceitos para o jornalismo, conceitos que podem ser colocados em prática imediatamente, o que não seria possível numa tv privada onde o jornalismo depende do departamento comercial. No caso da TV Brasil, o patrocinador é o povo brasileiro e a linha mestra editorial é a Constituição Brasileira, que compromete-se com a integração latino-americana. E esta integração tem que ser também informativa e cultural. E teria sido a solidariedade política do povo e do governo brasileiro para com o povo de Honduras, pois, dado o seu simbolismo para o momento, todos os povos fomos alvos do golpe de estado hondurenho.A criação da Sociedade dos Amigos da TV BrasilDentre as várias propostas apresentadas na Audiência uma destina-se a agregar participação do público para um diálogo propositivo e organizado da TV Brasil com o telespectador. Trata-se da idéia da criação de uma Sociedade Brasileira dos Amigos da TV Brasil, com capacidade tanto de estimular por parte do público a qualificação de sua leitura crítica televisiva, criando mais canais pelos quais (além da Ouvidoria que só a EBC possui) os impactos da programação em diferentes partes do país sejam captados, comunicados, refletidos de modo organizado e regular, fazendo com que se desenvolva por meio de uma emulação e fruição de opiniões e propostas, uma noção de pertencimento e co-responsabilidade do público em relação à emissora pública.Esta Sociedade estimularia a participação crítica dos telespectadores - idéia rigorosamente desprezada e vetada na tv comercial - na linha de uma cidadania televisiva. Diante da baixaria televisiva privada, devemos zelar, consolidar e qualificar a tv que nos pertence diretamente, assumindo como coletivo, e não apenas pelos seus dirigentes, o desafio de uma televisão cada vez mais humanizadora, um contribuição brasileira para a tv mundial. Mas que também seja capaz de disputar audiência, sem ilusões com o diletantismo da tese que defende indiferença diante do número de telespectadores sintonizados . Em se tratando de política pública de comunicação e de televisão em particular, será temerário cultivar a idéia de que devemos ser indiferentes se milhões de brasileiros seguem capturados por uma programação embrutecedora da tv comercial que reforça práticas anti-cidadãs, anti-democráticas na sociedade. Deve-se colocar como problema de todos, coletivo, que a TV Brasil tem o direito de pretender ter audiência e que para isto deva também ter uma programação de entretenimento sadio e inteligente, até mesmo aceitando o desafio de produzir, quando possível, teledramaturgias culturalmente elevadas, sobretudo para oferecer ao povo a chance de conhecer em profundidade a vida de personagens relevantes de nossa história tais como Santos Dumont, Euclides da Cunha, Villa-Lobos, no bem sucedido formato de telenovelas. Como desdobramento, é importante levantar o debate sobre o legítimo direito da TV Brasil em não se submeter às várias formas de reservas de mercado impostas pela TV comercial, com o concurso de recursos públicos. A TV Brasil pode e deve pretender ter uma programação de futebol e demais esportes de massa, de Carnaval e demais festas populares (como já começa a experimentar com sucesso o São João Nordestino) e também não se sujeitar à verdadeira reserva de mercado informal existente para a telenovela. Tal como disse o presidente do Conselho Curador da EBC, Luiz Gonzaga Beluzzo: a TV Brasil também deveria poder transmitir o Campeonato Brasileiro, o que no fundo indica que há uma legítima resistência que precisa ser organizada contra a tendência de privatização da transmissão de futebol pela filosofia da tv paga, dificultando cada vez mais que os brasileiros tenham acesso a umas de suas grandes paixões. Absurdo: quanto mais tecnologia televisiva, menos acesso para a grande maioria à totalidade dos jogos!Leitura crítica da comunicaçãoExiste um clamor difuso na sociedade brasileira contra a programação degradante das tvs comerciais, mas há evidentemente um captura de sua audiência ainda em razão da não existência de alternativas na TV Pública com a força, a decisão e a qualificação para fazer plenamente e “pra valer” uma disputa de audiência. Um componente deste intrincado problema é a inexistência de uma prática de leitura crítica da televisão - mesmo estando nas emissoras da EBC as raras oportunidades para que isto se realize, nos programas da Ouvidoria e no Ver TV - e é isto também que poderia ser estimulado com a criação da Sociedade dos Amigos da TV Brasil, com debates bem organizados, com a publicação de textos, com a realização de encontros, inclusive com multi-auditórios e com transmissão simultânea. Trata-se de investir em democracia televisiva. Não devemos deixar passar esta oportunidade preciosa como antes ocorreu, quando em 2004 o Presidente Lula criou a RTVI (Rede de TVs Institucionais) tendo sido combatido oficialmente tanto pela Abert como pela Fenaj. Sem apoio, desistiu da iniciativa, até porque o governo vivia outras dificuldades e o tema comunicação só foi retomado mais tarde com a criação da EBC e da TV Brasil. Esta linha de fortalecimento da comunicação pública, da qual fazem parte a nova política de democratização dos anúncios públicos, a criação do Blog da Petrobrás e até mesmo presença de Lula diretamente no jornalismo com sua coluna “O presidente responde”, é indicadora de condições para novos passos à frente, sobretudo para um formato mais democrático da tv digital, assegurando de fato pluralidade, diversidade, regionalização e humanização. Este é um tema para a Conferência Nacional de Comunicação, que também é uma novidade democrática, tirando o tema da penumbra dos tabus e tornando-o agenda do governo e da sociedade.Com sua primeira audiência a TV Brasil dá um passo bem significativo no rumo de conquistar novos modos de fazer e de ver tv, tanto para se perceber os limites a corrigir e superar, mas sobretudo por ser esta novidade democrática de imensa significação política para o fortalecimento das políticas públicas. A audiência também funciona como uma espécie de convocação à sociedade para o desenvolvimento e até mesmo para a invenção de novos instrumentos capazes de sustentar, dialogar, questionar e consolidar a TV Brasil e o seu modo de fazer televisão e jornalismo como direito e tarefa de todos.(*) Beto Almeida é presidente da TV Cidade Livre de Brasília.
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